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terça-feira, 12 de janeiro de 2021

RIVALIDADES E ALIANÇAS EUROPEIAS - SÉCULOS XIX E XX





                As rivalidades e alianças europeias  que antecederam à Primeira Guerra Mundial foram fatores fundamentais que levaram ao desentendimento as nações mais poderosas do mundo de então. Esta guerra, que de início era apenas europeia e em 1917 tornou-se mundial, pode ser considerada uma ponte entre a era da hegemonia europeia e a da política global. Ela marcou o fim de um período da história e início de outro.
          Entre 1871 e 1914, o sistema de Estados atingiu seu apogeu na Europa. As grandes potências conseguiram estabelecer controles sobre o mundo não-europeu numa extensão até então nunca vista e procuraram garantir sua segurança através de uma estrutura de alianças e apoios diplomáticos. Enquanto permaneceu flexível , apesar das ameaças sempre implícitas de guerra, essa estrutura permitiu a solução pacífica das rivalidades políticas. 
            Em 12 anos, quatro guerras resolveram as disputas italianas e alemãs, e alteraram o mapa da Europa, da Dinamarca à Sicília. Após 1871, por 40 anos, não houve conflitos entre as grandes potências e, embora persistissem ressentimentos nacionalistas, as questões territoriais deixaram de ser problema para a maioria dos governos. 
        Das grandes potências, só a França não se conformou com a extensão do Império Alemão, que lhe roubara a primazia na Europa. Mais do que a cessão da Alsácia-Lorena, em 1871, esse inconformismo foi a principal causa da desavença franco-alemã, responsável por mudanças de apoio das grandes potências durante a paz armada de 1871 a 1914. Mas nada disso foi ameaça à paz; a França não podia desafiar  uma Alemanha que se tornara, no fim  do século XIX, a maior potência militar e industrial do mundo. Nem tinha condições, na primeira metade desse período de paz armada, de achar um aliado para contrabalancear o poder alemão. 
            Os outros cinco maiores  Estados europeus aceitaram o novo equilíbrio de poder  surgido em 1871. Nem Áustria-Hungria nem Rússia sentiam-se inclinados a apoiar a França, porque os três impérios do Leste  compartilhavam de uma ideologia conservadora de cooperação contra a ameaça de uma revolução proletária, vislumbrada por eles na Comuna de Paris, de 1871, nas atividades da Segunda Internacional, após 1889, e no progresso da democracia social com suas consequências sobre o progresso  da industrialização. Em 1882, o próprio governo italiano juntou-se aos conservadores e reprimiu a propaganda pró-independência que atingias os italianos ainda  sob o governo dos Habsburgos. Na década  de 1880, fatores econômicos, sociais, políticos e estratégicos levaram as potências  europeias (exceto a Áustria) a intensificar  suas atividades "imperialistas" fora da Europa. Disputas sobre Túnis (1881) e sobre o Egito (1882) fizeram com que as relações da França com a Itália e Grã-Bretanha se tornassem tão frias quanto suas relações com a Alemanha. Os elos dinásticos  entre os Hohenzollern e os Romanov, além do interesse comum de suprimir o nacionalismo polonês, ainda contavam nas relações russo-germânicas. Após 1871, por 20 anos, a Alemanha convenceu a maioria  da Europa de suas intenções pacíficas e conservadoras. A França ficou isolada.
              A "Aliança Dual de outubro de 1879, estipulou que a Alemanha não permitiria que a Áustria-Hungria sucumbisse a um ataque russo. Mas a Alemanha, como império conservador interessado em controlar a Polônia, tinha afinidades com a Rússia. Bismarck simpatizava com os esforços russos para consolidar sua posição na Bulgária. Ele explorou o novo papel da Alemanha, como aliada, para forçar  o alinhamento da Áustria-Hungria, ignorando seus esforços para obter o apoio da Grã-Bretanha, Itália e Alemanha contra a Rússia.    A Áustria-Hungria, rejeitada por Gladstone, voltou a cooperar com a Alemanha e a Rússia na Aliança dos Três Imperadores em 1881. A Monarquia Dual sustentou -se ainda com a Tríplice Aliança (1882), que garantiu a neutralidade da Itália em caso de guerra com a Rússia; suas alianças com a Sérvia e a Romênia diminuíram o risco  de a Rússia explorar o irredentismo sérvio e romeno contra ela. A Tríplice Aliança foi mais útil para a Alemanha, proporcionando assistência à Itália em caso de ataque francês. A Aliança dos Três Imperadores  sobreviveu à crise provocada pela união da Bulgária com a Romênia Oriental, em 1885, mas não resistiu à divergência russo-austríaca pelo controle da Bulgária em 1886/87. Bismarck prometera aos russos apoio contínuo no Tratado de Resseguro, mas os acordos "mediterrâneos" de fevereiro, março e dezembro de 1887, entre Grã-Bretanha, Itália e Áustria-Hungria (e Espanha, após maio), para resistir a supostos planos franceses e russos no Mediterrâneo e estreitos, aniquilaram a influência russa na Bulgária. 
                A Itália aderiu à aliança austro-germânica-romena em 1888 e, entre 1889 e 1894, a Alemanha, com novo imperador e novo chanceler, voltou a alinhar-se à Entente Mediterrânea. Após 1887, antes que o Tratado de Resseguro fosse abandonado, com a queda de Bismarck, em 1890, as relações russo-germânicas já haviam se deteriorado devido a disputas sobre tarifas e empréstimos. A França aproximou-se da Rússia; o primeiro de uma série de empréstimos  foi concluído em 1888 e uma convenção militar foi assinada em 1892. 
          Até 1905, fatores diplomáticos e econômicos deram à Alemanha segurança no campo armamentista. Com o "cerco" de 1914, o rápido desenvolvimento do complexo militar-industrial da Rússia e os gastos alemães com armamentos navais, fizeram com que o equilíbrio militar deixasse  de pender para as Potências Centrais. 
             Menos difícil que a desavença franco-alemã, mas igualmente persistente, foi o desacordo entre austro-húngaros e russo no sudeste da Europa, onde um mau governo e um nacionalismo rebelde ameaçaram destruir o Império Otomano. A Rússia achava vital a garantia de que nenhuma outra potência pudesse controlar os estreitos de Bósforo e Dardanelos (otomanos), por onde circulava a maior parte de sua exportação de cereais. O objetivo da Rússia era defensivo, mas suas táticas incluíam tanto a tentativa de influenciar o governo otomano como o incentivo à resistência dos cristãos, na esperança de substituir o império por satélites submissos. 
           Para a Áustria-Hungria, os esforços da Rússia em buscar a segurança , ampliando a influência no Império Otomano, pareciam perigosos por ameaçarem seus mercados "coloniais" nos Bálcãs e possibilitarem um conjunto de Estados buscando a independência  sob proteção russa. Mas, nesse período, os austríacos mantiveram um entendimento  com o governo czarista contra o nacionalismo revolucionário na Rússia e no Império Otomano. Quando esses acordos foram rompidos (1878, 1886, 1908), a Áustria-Hungria tentou obter o controle dos Estados balcânicos, formando coalizões internacionais contrárias à Rússia. 
           A Áustria-Hungria tinha o apoio do Reino Unido, onde muitos viam os interesses da Rússia no Império Otomano como ameaça às rotas para a Índia, por terra ou pelo canal de Suez. Por esse ponto de vista,as rotas já eram ameaçadas pelo expansionismo russo em direção à Pérsia e ao Afeganistão. Até o acordo anglo-russo de 1907, que removeu tais receios, A rivalidade entre os dois poderes no Oriente Próximo, na Ásia central e, na década de 1890, na China, foi determinante nas relações diplomáticas entre o Império Britânico e as potências continentais. A entente anglo-ítalo-austríaca de 1887/97 contra a Rússia (e a França) foi, segundo Salisbury  relatou à rainha Vitória, "tão próxima de uma aliança quanto o caráter parlamentar das nossas instituições o permitem". 
            No início da década de 1890, a Alemanha apoiou esse acordo. Em 1887, Bismarck aumentou as tarifas sobre importações de cereais russos para proteger proprietários de terras prussianos. Ele proibiu a prática russa de tomar emprestadas, na Bolsa de valores de Berlim, quantias necessárias para financiar ferrovias estratégicas e armamentos, considerados uma ameaça. Quando a França colocou a Bolsa de Paris à disposição da Rússia, abriu caminho para aliança franco-russa de 1894. As tentativas alemãs para evitar a cooperação com a Rússia no Extremo Oriente, após 1895, foram em parte bem-sucedidas. Mas a concentração dos interesses da Rússia na região levou os austríacos, em 1897, a restabelecerem a entente conservadora. Pela entente russo-austríaca de 1897, os alemães abandonaram a "Nova Ordem", cessando o apoio à Áustria-Hungria nos Bálcãs e cooperando, no Extremo Oriente, com Rússia e França. A Grã-Bretanha, após os massacres armênios, recusou-se a prometer lutar pelo sultão. A Áustria-Hungria, com conflitos internos e alianças balcânicas em declínio, conformou-se com uma entente com a Rússia para amenizar seus problemas nos Bálcãs em 1897. A Rússia melhorou sua posição na Bulgária, assinando uma convenção militar, em 1902, e na Sérvia, após um golpe nacionalista do exército, em 1903. 
               No fim da década de 1890, coexistiam três grupos de poder na Europa: o Império Britânico, a aliança franco-russa e a Tríplice Aliança (Alemanha, Áustria-Hungria, Itália) que era um instável equilíbrio que permitia manobras políticas e, assim, favorecia a paz. 
              Em 1902, a França - em parte para enfraquecer a Tríplice Aliança - resolveu sua disputa de 20 anos com a Itália; em 1904 firmou acordos com a Grã-bretanha sobre o Egito e o Marrocos. Rússia e Áustria-Hungria ampliaram sua entente. Fracassaram os esforços alemães de se aproveitar dos problemas da Rússia em relação ao Japão, para renovar ligações formais com São Petersburgo e de intimidar a França, para que abandonasse seus acordos com a Grã-Bretanha. O elo anglo-francês foi reforçado depois que a Rússia acertou suas disputas  extra-européias com a Grã-bretanha, em 1907. 
          A simplificação dos alinhamentos políticos  num sistema bipolar começou com a "Weltpolitik" alemã, um desafio às três potências imperiais que convenceu a Grã-Bretanha  de que a Alemanha pretendia dominar a Europa. Em 1907, a Grã-Bretanha  uniu-se à França e à Rússia na Tríplice Entente, para conter ou "cercar" a Alemanha. Através de acordos com Itália, Grã-Bretanha me Espanha (1902/04), a França preparou-se para ampliar sua influência no Marrocos. As objeções alemãs às intromissões francesas entre 1905 e 1912 foram determinantes para encorajar o governo britânico a reforçar seus elos com a França, a fim de impedir que a Alemanha destruísse o equilíbrio de poder na Europa.
                 Entre as crises marroquinas de 1905 e 1911, as relações anglo-germânicas, complicadas pela questão naval, atingiram seu ponto mais baixo. O atrito entre Rússia e Áustria-Hungria quanto à "Guerra dos Porcos" austríaco-sérvia (1906/11), o projeto da Ferrovia Sanjak e a anexação da Bósnia e da Herzegovina encerraram a entente de 1897 e complicaram as relações russo-germânicas (embora o acordo de Potsdam, em novembro de 1910, sobre a estrada de ferro da Pérsia e Bagdá, tenha mostrado que a comunicação com São Petersburgo não havia sido rompida). Entre 1911 e 1914, as relações entre a Tríplice Entente se deterioraram. As restrições da última em relação às ambições da Itália e Albânia ajudaram a restaurar os laços entre a Itália e seus aliados. Em 1912/13, a Áustria-Hungria observava alarmada a Liga Balcânica, patrocinada pelos russos, expulsar os turcos da Europa. A aliança austríaco-romena era letra morta. Embora houvesse sinais de cooperação anglo-germânica quanto aos problemas balcânicos e coloniais, as relações russo-germânicas se deterioravam acentuadamente. 
                A simplificação dos alinhamentos políticos num sistema bipolar começou com a "Welpolitik" alemã, um desafio às três potências imperiais que convenceu a Grã-Bretanha de que a Alemanha pretendia dominar a Europa. Em 1907, a Grã-Bretanha  uniu-se à França e à Rússia na Tríplice Entente, para conter ou "cercar" a Alemanha. Em 1914, os alemães e os aliados austríacos preocupavam-se com esse cerco, especialmente nos Bálcãs. A ruptura  da entente austro-russa, quando a Áustria-Hungria anexou a Bósnia e a Herzegóvina (1908, e as guerras dos Bálcãs (1912, e 1913, que substituíram a "Turquia-na-Europa" por um complexo de estados balcânicos, criaram uma situação explosiva.  Em 1914, as ambições sérvias reabriram a disputa, obrigando Viena a tomar uma decisão. Quando Berlim, com medo do "cerco", decidiu apoiar Viena com maior peso do que permitiam os termos da aliança defensiva de 1879, começava acender o estopim  da Primeira Guerra Mundial. 

Nicéas Romeo Zanchett 
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