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quinta-feira, 26 de novembro de 2020

AS GUERRAS E O COMÉRCIO NA IDADE MÉDIA

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        Durante a maior parte  da Idade Média, a Europa Ocidental foi uma sociedade organizada para a guerra. A ordem social e econômica se estabeleceu em função das demandas do estado de guerra e um dos objetivos principais do sistema feudal foi a manutenção de uma força de cavaleiros armados. Teoricamente, no Estado feudal, todas as terras pertenciam ao ri, que distribuía parcelas aos senhores, como vassalos, em troca dos seus serviços. Estes, por sua vez, entregavam terras para outros senhores e assim sucessivamente.  Para formar um exército medieval, o rei convocava os seus vassalos para que formassem parte do Exército e reunissem um número determinado de cavaleiros; cumpriam com esta exigência levando seus próprios vassalos, que por sua vez chamavam os seus, e assim sucessivamente até a menor parcela de terra capaz de equipar  e manter um cavaleiro.  
         O cavaleiro medieval era um grande guerreiro adestrado, treinado desde jovem, mediante a prática constante  e a experiência direta com a guerra. Lutar era a razão de ser e o principal passatempo da nobreza; oathos do valor militar e a lealdade ao senhor eram enormes. mas um cavaleiro medieval com cavalo de combate, armadura e escudeiro constituía um investimento custoso. De fato, no século VIII costumava-se dizer que o equipamento militar para um homem custava ao redor de 20 bois, equivalente ao necessário para que dez famílias lavrassem a terra. 
 |o entanto, uma força efetiva de cavaleiros era essencial para a segurança de qualquer reino ou principado, e as estruturas sociais e econômicas se adaptavam de acordo com essa necessidade. 
         A superioridade do cavaleiro montado foi uma novidade na Idade Média e dependeu em grande parte da introdução do estribo. A cavalaria sempre foi importante para a guerra, mas a capacidade de realizar um ataque coordenado a galope com lanças só surgiu quando os cavaleiros tiveram um apoio firme para os pés e puderam assegura-se de não serem derrubados pela força do impacto. O estribo de ferro, oriundo do nordeste da Chia no século IV, foi levado para o Ocidente por guerreiros nômades durante o século VII.  Com o uso do estribo, homem e cavalo formavam uma força única, como se fosse um só corpo.  Como todas as inovações militares, suas vantagens foram rapidamente reconhecidas, sendo logo utilizado pela cavalaria bizantina e pelos cavaleiros de Carlos magno. Durante quase mil anos, na Europa, a principal característica da guerra foi a carga maciça da cavalaria. 
               Os guerreiros de Carlos |magno e de Guilherme da Normandia utilizavam colete de malha, mas aqueles dos séculos posteriores se protegiam com uma couraça de placas de ferro acopladas. Da mesma forma, foi desenvolvida a criação de cavalos maiores e mais fortes que pudessem suportar o peso adicional. Os animais eram levados para a guerra com armadura. 
      A orientação militar da sociedade fazia com que grandes esforços e riquezas fossem destinados a armamentos e fortificações. Lentamente começaram a ser utilizados coletes de malha com proteções de ferro nas partes mais vulneráveis, e no século XIV apareceram as armaduras de ferro. As armas ofensivas procuravam acompanhar a evolução, primeiro com a adoção da besta chinesa, durante o século X, que possibilitava atravessar a couraça mais grossa, logo, no século XIV, com o desenvolvimento do canhão. Os canhões não eram usados apenas em operações de campo, mas também nos cercos, que constituíam uma das principais características das guerras medievais. A insegurança generalizada e as frequentes hostilidades obrigaram a adotar defesas seguras e todos os nobres que podiam dar-se a esse luxo construíram castelos  ou casas fortificadas. No início as fortificações eram construídas  de terra e de madeira, porém, durante o século XI, apareceram cada vez mais as fortificações de alvenaria. O projeto da arquitetura militar foi ficando mais sofisticados durante a Idade Média, tendo deixado impressionantes  monumentos medievais, tais como o castelo construído por Eduardo I em Gales ou as fortalezas dos cruzados no Levante.   
Besta de repetição

Besta comum

       O rumo dos acontecimentos no norte da Itália durante a Alta Idade Média diferenciou-se significativamente daquele da Europa ao norte dos Alpes. Reunificada pelos generais de justiniano por um breve  período em meados do século VI, a Itália voltou rapidamente a se fragmentar  e no fim do século IX estava dividida entre bizantinos, lombardos, árabes e francos. Nessa época confusa, os poderosos senhores feudais consolidaram seus controle sobre as zonas rurais, enquanto árabes e magiares atacavam sem impunidade. Apesar destes revezes, a Itália conseguiu manter nas cidades o nível de cultura perdido no resto do país e que constitui a base do renascimento cultural e econômico nos séculos vindouros. Os principais portos, como Veneza, Nápoles, Gaeta e Amalfi, continuaram funcionando sob o domínio bizantino e seguiam respeitando as leis escritas. De fato, o nível de educação era surpreendentemente considerando-se a insegurança  da época e o confuso ambiente político; os registros demonstram que em algumas cidades mais de 75% das testemunhas em juízo sabiam o seu nome, embora provavelmente estas pessoas pertencessem aos setores mais privilegiados da sociedade. 
           Com o surgimento das Cidades-Estado, os conflitos entre o papa e o império e o poder das cidades impediram a unificação da Itália. Depois do ano de 1250 o poder das Cidades-Estados independentes era exercido por oligarquias republicanas ou por déspotas que com frequência surgiam como alternativa à violência das facções políticas em luta. No entanto, isto demonstrou ser positivo. Gênova e Veneza tornaram-se os portos livres mais poderosos da Europa, criando vínculos vitais entre os mercados e os produtores do leste e do noroeste da Europa. Florença tornou-se um poderoso centro financeiro e em muitas repúblicas surgiam hábeis administradores e empresários, que estabeleceriam as bases do Renascimento europeu. A Alegoria do Bom e do Mau Governo, de Ambrósio Lorenzetti  enfeita o Palazzo Público em Siena e comemora as virtudes do planejamento urbano republicano e da administração pública. 
           A recuperação do comércio exterior, durante os séculos XI e XII, significou uma grande oportunidade para as cidades do norte da Itália, situação aproveitada com vigor. Já no fim do século X, os italianos mantinham relações comerciais com Constantinopla, a Alexandria muçulmana e a Inglaterra anglo-saxônica. Veneza foi beneficiada por taxas preferenciais concedidas pelos senhores bizantinos, tendo rapidamente dominado o comércio no leste do Mediterrâneo. Gênova e Pisa, por outro lado, estreitaram seus vínculos com o norte da África, exportando tecidos da Lombardia e da Alemanha em troca de joias, perfumes e especiarias do Oriente. 
         À medida que o comércio se desenvolvia, os mercadores ricos e as classes profissionais começaram a exigir de seus senhores maior participação no controle sobre as cidades italianas do norte. Surgiram novos sistemas de governo comunal nos quais os grupos de cidadãos mais importantes elegiam seus próprios conselhos e oficiais, nascendo assim as Cidades-Repúblicas italianas. As cidades eram independentes e entre seus habitantes havia um poderoso sentimento  de patriotismo. Foram construídos impressionantes prédios públicos, palazzi publici, como centros do governo da cidade, com altas torres que simbolizavam a autoridade do município. Em Siena, a torre do Palazzo Público foi construída especialmente alta para superar a catedral e assim simbolizar a supremacia, na cidade, do poder secular sobre o eclesiástico. O orgulho cívico se manteve apesar de o governo republicano, no ano de 1250, ter dado lugar ao domínio senhorial - governo de famílias de déspotas como os Médicis em Florença ou os Visconti em Milão.
           O êxito econômico trouxe consigo o crescimento urbano. Em 1200, Pádua tinha mais de 15 mil habitantes; em 1320, 35 mil; ao passo que, no fim do século XIV, Florença tinha quase 100 mil habitantes e poderia ter competido com as principais cidades do mundo clássico em tamanho ne sofisticação. Porém, houve retrocessos. O rápido desenvolvimento das cidades trouxe enormes desigualdades de riqueza entre os bem-sucedidos mercadores e os cidadãos pobres. O cristianismo foi fundamental para a ressurreição da Europa medieval. Ao invés da secularidade do cristianismo ocidental, o cristianismo oriental olhava com horror o mundo secular e se recolhia na espiritualidade mística. Os franciscanos, uma ordem de pregadores mendicantes, surgiram como resposta a estes novos problemas e tentaram levar a religião à classe marginalizada pelos processos de mudança que estavam fora do seu controle. Contudo, apesar dos novos problemas, as cidades italianas estavam à vanguarda do desenvolvimento cultural europeu durante os séculos XIII e XIV: o berço de Dante Alighieri, Boccacio e Petrarca, de Giotto e de Duccio. Mais próspera e culturalmente mais desenvolvida, a Itália, no ano de 1400, estava entrando numa nora era: o Renascimento.
           Enquanto o comércio e o urbanismo se desenvolviam rapidamente ao sul da Europa, os reinos da Europa Oriental se  recuperavam da depredação causada pelas invasões dos mongóis. Ao norte dos Cárpatos e ao leste do Elba começaram a surgir poderosos Estados: Boêmia, Hungria e Polônia. Em meados do século, entre os anos de 1.330 e 1.380, houve uma notável recuperação governamental e grandes inovações. Foram fundadas universidades em Praga, no ano de 1348; Cracóvia, em 1364; Viena, em 1365; e Pécs, em 1367. A Boêmia se tornou uma grande potência financeira após a abertura das minas de prata de Kutna Hora, no século XIII. A polônia obteve lucros com a abertura da rota do mar Báltico pelos mercadores alemães, tornando-se um importante exportador de madeiras e cereais.  Utilizando uma nova força econômica, os governantes desse período - Carlos IV da Boêmia, Casimiro II da Polônia e Luiz, o Grande, da Hungria - estabeleceram Estados centralizados segundo o modelo ocidental. Seus Objetivos eram controlar a nobreza, incentivar a formação de novas classes econômicas, codificar as leis e estabelecer tribunais reais perante os quais todas as classes sociais se submeteriam, principalmente a nobreza. 
         O fator decisivo na transformação da Europa do Leste, porém, foi o fluxo dos colonos alemães e flamengos, que limparam os bosques, secaram pântanos, fundaram povoados e criaram grandes reservas  de terras cultiváveis capazes de sustentar uma população crescente. A colonização alemã ao leste, inicialmente militar e destruidora, logo tornou-se uma ampla corrente de migração camponesa com o apoio de príncipes eslavos, ansiosos por aumentar seus territórios. Uma segunda corrente imigratória veio pelo mar, com a fundação de uma série de cidades  alemães ao longo do litoral báltico: Lubeck, Rostock, Stettin, Kolberg. Destas emergiu a poderosa Liga Hanseática, fundada no ano de 1358. 
        Menos pacífica foram, as incursões dos cavaleiros, uma ordem de cavaleiros cruzados convocada pelo duque polaco de Moscóvia  contra  seus vizinhos pagãos prussianos. A conquista da Prússia, ao contrário da colonização alemã além do Rio Oder, foi uma cruel operação militar seguida de uma colonização  sistemática. Entre os anos de 1280 e 1410 foram fundadas perto de 1400 aldeias  e 93 cidades. Mas, o êxito dos cavaleiros teutônicos e suas claras ambições territoriais converteram-nos numa ameaça para a Polônia e à Lituânia; a expansão germânica foi detida no início do século XV. Entretanto, as mudanças do século XIV tiveram grande importância e o surgimento da Polônia, Hungria e Boêmia representou uma nova era na história da Europa Oriental. 
           O mapa feudal da França era muito complexo, com as possessões inglesas estendo-se desde a Normandia até o litoral do Mediterrâneo. A determinação dos reis franceses em garantir seu poder sobre esta terras e sobre Flandres gerou uma série de guerras importantes. No século XIV as despesas da guerra e a centralização haviam provocado sérios problemas internos. 
           Depois do importante desenvolvimento cultural e econômico dos séculos XII e XIII, os reveses do século XIV tiveram grande impacto sobre a Europa Ocidental. A causa foi um monstro de três cabeças: a guerra, a peste e a insurreição popular. 
             Nenhum pais da Europa Ocidental esteve livre da guerra durante os séculos da Idade Média, mas as guerras do século XIV foram especialmente brutais e destruidoras. Amais sanguinária foi a chamada Guerra dos Cem anos, na qual as rivalidades dinásticas entre a Inglaterra e a França, que existiam desde o ano de 1.204 pela perda dos domínios angevinos na França, explodiram em conflito aberto. O motivo alegado foi a acusação de Eduardo II, rei da Inglaterra, de que a coroa francesa havia causado a morte do último rei francês de dinastia dos Capetos, Carlos IV, no ano de 1328. As hostilidades começaram seriamente  com a batalha naval de Sluis, além do Rio Escalda, em 1.340, onde a frota inglesa foi a vitoriosa. Eduardo III tentou conquistar a França, conseguindo importantes vitórias sobre as forças francesas em Crécy (1346) e Poitiers, dez anos mais tarde. Porém, apesar de a captura do rei da França e a decadência de grande parte da nobreza, as forças inglesas foram incapazes de obter um êxito duradouro. Aos poucos, os franceses recuperaram, próximo ao fim do século, a maior parte das conquistas territoriais dos ingleses e a vitória de Henrique V em Azincourt determinou o início de um novo ciclo de vitórias que os ingleses não puderam consolidar. A mensagem era clara: os habitantes da França se consideravam franceses e não estavam dispostos a se deixar governar  por um poder estrangeiro. O principal resultado das guerras foi a crise econômica e a escassez. Ao mesmo tempo, os Estados aumentavam os impostos para financiamento da luta e os soldados saqueavam tudo o que encontravam pela frente. 
GUERRA DOS CEM ANOS
           Se o objetivo da  Guerra dos Cem Anos era fortalecer as identidades nacionais, o segundo fator da crise do século XIV não respeitou as fronteiras. Em 1346, chegaram à Europa os primeiros rumores sobre uma grave peste que assolava o Oriente. Falava-se do despovoamento da Índia, da Síria e da mesopotâmia cobertas de cadáveres. Não transcorreu muito  tempo para que a própria Europa se visse afetada pela peste. Ironicamente, a causa foi o êxito da economia européia. Nos séculos anteriores, o contato entre Europa e o Oriente havia sido muito escasso e as epidemias não tiveram oportunidade de se propagar. Contudo, próximo do século XIV, as cidades italianas mantinham relações comerciais com a parte oriental do mediterrâneo e compravam seda e especiarias da China e da Ásia central. As consequências foram desastrosas para a Europa.
               A monarquia da Europa Ocidental, sem financiamento e enfraquecida por guerra e problemas  internos, sofreu severos transtornos ao longo do século XIV. A recessão, aliada à fome e a peste, provocou conflitos em todos os países entre a autocracia e as oligarquias urbanas, por uma parte, e os camponeses e o proletariado urbano, pela outra. A igreja Ocidental sofria  o cisma, e povo pedia ao papa que falace com Deus para livrá-los da peste.  
             Em outubro de 1347, uma frota de doze galeras genovesas chegou ao porto siciliano de Messina; os tripulantes traziam "a doença aderida aos ossos". Em poucos dias, Messina estava afetada por uma grave epidemia e no ano seguinte toda a Itália estava contagiada. Nas populosas cidades italianas, aproximadamente a metade dos habitantes desapareceu e apenas as comunidade de remotas áreas rurais conseguiram sobreviver sem ser afetadas. Em Veneza, durante a pior época da Peste Negra, 600 pessoas morriam diariamente. da Itália, a peste se estendeu para outras regiões da Europa: França, em meados do ano 1.348; Inglaterra, Espanha e Alemanha, no fim do mesmo ano; escócia em 1.349; e Escandinávia em 1.350. 
           É difícil calcular os índices de mortalidade, mas acredita-se que a "Peste Negra" eliminou aproximadamente, um terso da população europeia entre os anos 1.347 e 1.350, com novos surtos graves que causaram perdas consideráveis de vida entre as décadas dos anos de 1.360 e 1.370. O resultado foi uma séria desordem econômica e social, com uma acentuada escassez de alimentos, mão-de-obra e consequente inflação. A diminuição da população favoreceu os camponeses, que encontraram novas oportunidades de melhorias materiais. Porém, muitas destas esperanças  frustraram-se pela reação dos senhores e da nobreza urbana. Foram criadas leis trabalhistas num esforço para fixar os camponeses na terra e regulamentar os salários urbanos. Isto provocou muitas revoltas populares, principalmente em Flandres e na Inglaterra, onde a grande revolução camponesa do ano de 1.381 teve como causa a rejeição de um novo imposto e o radicalismo religioso que, por sua vez, gerou um espírito anticlerical. os governos reprimiram essas revoltas  com severidade. 
             A peste, que teve origem  asiática espalhou-se pelo continente  europeu aniquilando em dois anos um terço da sua população. Até o início do século XVIII não transcorreu uma década  sem que houvesse algum novo surto de importância. Ao contrário da fome, a peste afetava as pessoas de todos os estratos e classes sociais e os efeitos psicológicos forma consideráveis. A doença, que depois se descobriu ser transmitida pelas pulgas e transportadas por ratos em porões de navios mercantes, foi especialmente virulenta e muitos poucos dos que foram contagiados sobreviveram. A morte repentina se tornou um fenômeno cotidiano, e com frequência se encarava como tal. As seitas que pregavam o iminente dia do Juízo final eram comuns; e nos  Contos de Canterbury, de Chaucer (aproximadamente no ano 1387), e no Decameron, de Boccacio (aproximadamente em 1353), a morte era representada como um misterioso andarilho, sempre prestes a se apresentar perante algum viajante desafortunado. 

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