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domingo, 17 de maio de 2020

O HOMO SAPIENS E AS EPIDEMIAS NO MUNDO

- têrmo


               Com o tácito medo, a medicina apenas balbucia, enquanto os empestados fixavam os olhos  abertos, que ardiam com a doença e não sentiam sono algum." Esse trecho da Rerum Natura, obra do latino Lucrécio (98 x 55 a.C), mostra como o poeta percebia a incapacidade da medicina de resolver o grave problema das grandes epidemias que assolavam o mundo antigo. Lucrécio atribuía às "pestes" - termo que no seu tempo catalogava indiscriminadamente todas as epidemias - a causas naturais que confessava desconhecer. Acreditava que os deuses, deitados numa nuvem macia, não estavam muito preocupados em interromper sua vida mansa, para interferir nos problemas da Terra. Nada parecida é a ideia expressa por Homero na Ilíada. No primeiro canto, encontramos Apolo, irado, a matar com suas flechas milhares de lutadores gregos. Esta é a explicação sobrenatural encontrada para a peste que devastou o exército ateniense e que foi descrita pelos historiador Trucídias (século V a.C.). 
                 No entanto, um contemporâneo de Lucrécio, Marco Terêncio Varro (117 x 27 a.C.), percebeu que, sem dúvida, devia haver relação entre as más condições de higiene e a "malária", que dominava Roma e toda a região rural em surtos endêmicos. Como tentativa de diminuir o mal, Varro aconselhava a drenagem  dos pântanos, afirmando que "talvez vivam nos lugares pantanosos pequenos animais que não possam ser percebidos pelos olhos, mas que penetrem o corpo pela boca e pelas narinas, causando graves desordens". Com isso, mostrou uma boa intuição do princípio de contaminação da "malária". Na verdade, embora tenham aparecido na antiguidade trabalhos que revelam alguma curiosidade científica, predominavam as interpretações supersticiosas para justificar as pestes. explicações como a de Varro não se difundiam, apesar da importância das doenças epidêmicas em toda a civilização clássica. 

A Devastação no Mundo Antigo
             As invasões bárbaras, subversão dos costumes, podridão das velhas estruturas e desorganização são alguns dos inúmeros fatores incriminados como responsáveis pela queda do Império Romano. A medicina pode apontar mais um fator, que nem sempre é lembrado, e que de certa forma concorreu para devastar mais rapidamente  o império. Em cerca de 250 anos, pelo menos cinco pestes alastraram-se pelo mundo antigo. 
                 No ano 79, logo após a erupção do Vesúvio que enterrou as cidades de Herculano e Pompéia, uma violenta epidemia matou milhares  de pessoas na região; 800 mil pessoas na Argélia e 200 mil na Tunísia. Um contingente de 30 mil soldados, enviado para socorrer os empestados, também foi destruído pela epidemia. 
            No ano 164, um exército traz da Síria nova peste, que talvez tenha sido tifo exantemático ou peste bubônica. O que se sabe é que, em menos de dois anos, morreram milhares de pessoas em Roma. A epidemia propagou-se por todo o império e alcançou os confins orientais, como uma frente de incêndio. Mais uma vez, no fim do século III e início do século IV, o mundo romano foi invadido por duas epidemias sucessivas de varíola. E, finalmente em 542, contam os cronistas que cidades do Oriente, antes de grande importância, foram abandonadas após uma violenta peste que se disseminou a partir de Constantinopla, em forma endêmica.
                Com a queda do Império Romano, houve um afastamento periódico da epidemias. O desaparecimento dos grandes aglomerados humanos, provocado pelo fracionamento do império, diminuiu a disseminação das epidemias. 
 
O Centeio Traiçoeiro

                  A História Natural de Plínio (23 x 79 d.C.) (Plínio - o Velho, historiador romano, morreu no Vesúvio) registra que os habitantes do Norte da Itália se alimentavam de centeio, por falta de outros recursos. As guerras e invasões, na decadência do Império Romano, provocaram a difusão desse cereal para suprir a carência alimentar. 
             A partir do século X, aparecem cada vez mais frequentes as descrições de uma nova epidemia, do chamado "fogo sagrado", que depois se popularizou na Europa como "fogo selvagem" ou "fogo de Santo Antônio". Sob forma convulsiva ou gangrenosa, o "fogo de Santo Antônio" predominava na França e Alemanha, justamente onde o centeio era mais usado. Em 994 causou cerca de 40.000 vítimas só na Aquitânia, região da França. Mas, à medida que o tempo transcorria, a mortalidade foi diminuindo e, na segunda metade do século XIII, aparecem cada vez menos menções à doença. 
                 Desde 1039, havia-se estabilizado uma relação entre o aparecimento da doença e o consumo de centeio, nas épocas de escassez. Mas somente em 1630, alguns curandeiros de uma região francesa reconheceram a existência de uma relação causa-efeito entre a ingestão de centeio e a manifestação de certos tipos de gangrena. 
              Na realidade, existe um cogumelo que se desenvolve no centeio, como parasita, em particular nas épocas úmidas. A farinha feita com o centeio assim contaminado apresenta elevado poder intoxicante e provoca alterações orgânicas, sob forma convulsiva gangrenosa, o chamado ergotismo. 

Exílio Forçado
                 A "lepra" é uma doença crônica ou de longa duração, que afeta primeiramente a pele, as mucosas do trato respiratório superior e os nervos periféricos. Acomete a vítima lentamente me agrava-se gradualmente durante a evolução, mas em muitos casos apresenta cura espontânea. O temor que desperta deve-se principalmente às deformações patológicas que pode causar ao paciente. 
                  A forma lepromatosa da lepra apresenta sucessivas erupções que vão deixando a pele do paciente cada vez mais grossa e irregular. A falta de sensibilidade pode levar o doente a ferir-se bastante. Os leprosos podem alcançar  até o tamanho de um ovo de pomba. Um dos cuidados que o leproso deve receber é com os ferimentos e as deformações que ocorrem enquanto a enfermidade se desenvolve . 
                Por muito tempo, acreditou-se que a "lepra" havia sido introduzida na Europa pelos cruzados. Mas os principais responsáveis pela difusão da nova peste foram de fato os fenícios: mercadores eméritos, levavam consigo a doença do Egito para toda a Europa. No entanto, a moléstia não era muito frequente até o século VI, quando as penetrações bárbaras auxiliaram sua difusão. Na Espanha, para onde foi levada pelos muçulmanos no século VIII, tornou-se conhecida como "Mal árabe". 
                 Em 789, a lepra era considerada razão suficiente para se pedir anulação do casamento; a importância do mal tornou-se cada vez maior e, entre 1200 e 1300, atingiu o auge da difusão. Mas até o século XIV o leproso gozou de relativa tranquilidade; e espírito da caridade cristã procurava dar-lhe apoio e evitar ao máximo sua humilhação, pois também era "filho de Deus". No entanto, já se acreditava no caráter contagioso da doença, e por isso foi adotado o costume de expulsar o leproso da comunidade. (A palavra Igreja, quer dizer comunidade). 
                 O doente era enviado para a periferia da cidade, onde passa a residir numa choupana, até a morte. No decorrer do século XIV, a situação do indivíduo contaminado pela lepra tornou-se cada vez mais difícil. talvez o número crescente de doentes, ou o medo de contaminação, tenham contribuído para originar a repugnância que a caridade cristã até então evitara. O leproso passa a ser visto como vítima da justiça divina; e passa a ser incriminado por toda espécie de crimes, sociais ou políticos. na Espanha, por exemplo, são acusados de pacto com os infiéis (árabes) que dominavam a região e torturavam para confessar tentativas de subversão política. 
            O indivíduo contaminado pela lepra, objeto de repugnância e rejeição, precisava denunciar de longe sua presença, com sinais convencionados. Acusados pelos mais variados crimes, os doentes foram mesmo submetidos a cerimoniais de sacrifício, os famosos "combustio leprosorum" (queima dos leprosos). O número de leprosos queimados sem dúvida contribuiu para diminuir o volume de doentes. A partir do século XVI, a lepra perde importância e, quando o médico francês Jacob Bontius descreve lesão da lepra, em 1642, vai observar os casos na longínqua Índia. 

Fantasia e realidade
             Muitas foram as pestes que atingiram a humanidade, desde suas origens; e também variaram muito as explicações. A fantástica "racionalização" dos gregos, que via o ataque direto dos deuses na origem das epidemias, foi substituída pela intuição de contágio, de Varro e outros, nos tempos romanos. Já na Idade Média, voltou-se a acreditar em influência astrais, e sobrenaturais,m como o castigo divino. 
              Apesar de tudo, ao aproximar-se a época do Renascimento, a tendência a substituir o pecado por agentes locais, como causas das epidemias, é cada vez maior. O ergotismo, ou "fogo Selvagem", passa a ser relacionado com a carência de meios normais de subsistência. E a queima dos leprosos é uma forma de defesa contra a disseminação da doença, que na época era muito mais contagiosa. 
                Mesmo o fato de se invocar santos contra as pestes não significava que se desconhece o caráter contagioso das doenças. Era uma forma de pedir o auxílio divino, para substituir as reconhecidas limitações da terapêutica. De qualquer forma, as causas de cada epidemia eram ignoradas. Os primeiros passos limitaram-se a identificar fatores concomitantes e desencadeantes, ou possível fonte de transmissão. 

Formas de contágio vivo
                "Devido a uma infecção do hálito... um infectava o outro... e não só faziam morrer quem com eles falasse, como também quem quer que comprasse, tocasse ou tirasse alguma coisa que lhe pertencesse" Assim um monge franciscano relata como a peste fora levada para a Sicília por treze galeras venezianas, em 1347. A epidemia mencionada é a peste que surgiu na Ásia Central por volta de 1333 e logo se alastrou pela Crimeia, Constantinopla, Egito, Sicília e daí para a Europa inteira, nas duas formas: a bubônica e a pulmonar. Foi a famosa "peste negra", que eliminou cerca de um quarto da população européia. A epidemia seguiu quase a risca o trajeto das rotas de comércio mais importantes, levada por mercadores e comerciantes. 

Recursos e Defesa
                  Com a peste surgiram numerosos  "regimes", que prescreviam sugestões para manter a saúde. O "Regime para a Peste", escrito por Alberto de Parma em 1349, recomendava uma refeição profilática, composta de três figos, três nozes, vinagre e arruda, "comidos em alegria", pois os pensamentos tristes e meditações provocariam a doença. Para circular pela ruas, era necessário também precaver-se com plantas aromáticas como mirra, incenso, gengibre, arruda e musgos. Mas se tudo isso não conseguisse evitar a manifestação da moléstia, nada melhor que provocar vômitos com água quente e óleo, para estômagos delicados, ou cebola com excremento de galo, para os estômagos mais resistentes. Assim o organismo eliminaria as comidas e bebidas "pestilenciais", causadoras da doença. Gotas de gengibre e teriaga, remédios à base de víbora, que constituía boa fonte de renda para Veneza, era o melhor tratamento. 
                 Receitas desse tipo eram comuns e variadas. No entanto, muitos já intuíam o princípio do contágio, embora ainda não se usasse esse termo. Tanto assim, que eram aplicados os recursos mais variados para evitar a difusão da doença. Entre eles é digna de menção a medida tomada por Barnabó, duque de Milão, que em 1374 introduziu uma medida profilática para defender a cidade das epidemias. Proibiu que entrassem na cidade viajantes ou mercadores vindos de lugares onde houvesse epidemia.  No mesmo ano, Veneza adotou também essa atitude. 
                 No entanto, tais medidas tinham como consequência a paralisação do comércio; para evitar isso, divulgou-se a aplicação de quarentenas. A primeira de que se tem notícia foi na verdade uma "trintena", estabelecida na república de Ragusa, região da  Iugoslávia. Para enfrentar o problema das epidemias, o conselho da república reuniu-se para tomar decisões similares às adotadas em outros lugares. Mas durante a sessão estabeleceu-se que, a parar o comércio, era preferível que a cidade inteira fosse levada pela peste. 
                Com a tentativa de salvar a cidade, mas também o comércio, ficou decidido que era suficiente obrigar, todos os que chegassem à cidade, a uma "purificação" preliminar, obtida com a estada, durante trinta dias, num lugar fora da cidade, sem contato algum com os cidadãos. A decisão foi posta em prática em julho de 1377. Todavia, coube a Marselha, na França, realizar a primeira verdadeira quarentena, Em 1383. 

O Contágio Existe
               Constatada pelas observações a ideia de que as inúmeras pestes "passavam" do indivíduo doente para o são, faltava descobrir como isso aconteceria, ou seja, quais os agentes causadores. A imaginação era o que mais trabalhava, para descobrir as causas das doenças, pois ainda não existia o microscópio, único recurso para observar mundos diminutos. Mesmo o médico mais "científico" era obrigado a apelar para a fantasia. 
                  O médico alemão Ulrich von Hutten, por exemplo, atribuiu a sífilis a "vermículi alati", pequenos vermes alados. Seu contemporâneo, o italiano Gerolamo Fracastoro (1478 x 1553), mais conhecido pelo poemeto que publicou sobre a sífilis, desenvolveu também uma teoria mais completa sobre a transmissão das epidemias, a chamada teoria do "contágio vivo". 
               Fracastoro distinguiu três tipos de contágio: direto, de doente para sadio; a distância, por meio do ar; e finalmente por meio de veículos, de denominou "fomites". Esses compreendiam a roupa do corpo, lençóis e objetos utilizados pelo doente ou mesmo as paredes do quarto. Convenceu-se disso ao observar que pessoas sadias podiam adoecer por entrar em contato apenas com objetos de uso do doente de tuberculose. Desse fato, Francastoro não só concluiu que a tuberculose é contagiosa, como também chegou à tese do contágio vivo. 
             A admitir a participação dos "fomites", colocou-se outra pergunta: o que passaria da pessoa doente para o fomite e deste para o indivíduo sadio, contaminando-o mesmo sem entrar em contato com o doente? Neste ponto, entra a imaginação do cientista, que nem sempre se distancia muito da realidade. Francastoro atribuiu essa transmissão aos "seminaria morbi" (sementes da moléstia), invisíveis a olho nu. 

Sementes Vivas
                  Francastoro afirma ainda que as sementes são seres vivos, tão pequenos que o olho humano não pode perceber. Instaladas no corpo, teriam a capacidade de viver às custas dos humores vitais do doente. Além do mais, a velocidade e a proporção de sua reprodução seriam tão grandes que impediriam a vitória da força terapêutica da natureza ("vis curatrix"), que seria o próprio sangue (plasma). talvez seja ousado demais supor que nesta última proposição Francastoro já tenha previsto a teoria da formação de anticorpos. No entanto, foi de qualquer maneira uma antecipação, pois só no fim do século XIX é que vai ser constatada a função defensiva do sangue no organismo. Toda a teoria de Francastoro a respeito do contágio através do parasitismo de animais microscópios era prematura ainda para ser aceita, e ele não dispunha de nenhum recurso técnico para comprová-la. 
                  Com a entrada do microscópio no cenário científico, as coisas sofreram substancial alteração. 
              Uma das primeiras notícias a respeito da existência de agentes causadores de doenças foi dada pelo padre jesuíta Athanasius Kircher (1601 x 1680). Ao examinar um preparado de pus e sangue retirado de um portador da peste bubônica, Kircher acreditou ter encontrado os "animaizinhos minúsculos" responsáveis pelo contágio. Na realidade, foi um engano e o agente etiológico da peste só foi descoberto pela atual microbiologia. Mas de qualquer forma, sua "descoberta" constituiu, na época, uma importante contribuição para a "patologia animada". Contribuiu para incentivar ainda mais o uso do microscópio, a grande conquista do século XVII. 

A Incômoda Coceira
                 Coçar-se em público, no século XVII, não era sinal de falta de elegância nem de má educação, mas apenas um hábito necessário. Nessa época, mesmo as classes mais favorecidas não primavam pelos bons hábitos de higiene. E com isso se difundia e persistia a sarna, ou escabiose, em caráter quase endêmico. A curiosidade de alguns médicos despertou o interesse pela procura das causas desse incômodo. 
                Já no fim do século, um médico toscano, Giovancosimo Bonomo, juntamente com seu colaborador Giacinto Cestoni, conseguiu localizar os "pellicelli", pequeníssimos germes gerados na pele dos portadores de sarna (ácaro) e que, ao roerem, causariam a agudíssima coceira. Essa foi a explicação que encontraram para justificar as observações efetuadas. 
             Haviam notado que, nos pontos onde a coceira é mais intensa, existem pequenas bolhas não amadurecidas  e, ao abri-las, Bonomo viu sair, após uma "aguinha", um pequeno globo branco. Ao microscópio, percebeu a existência de um "pellicelli" (animalzinho), o pequeno verme gerado na pele do corpo, de acordo com a teoria da geração espontânea. Faltava ainda descobrir como nasceriam os animaizinhos. 
               A resposta aparece um dia a um desenhista que observava "pellicelli" ao microscópio para reproduzi-los:  subitamente, vê um pequeno animal depositar uma fileira de ovos. Contata-se assim que também esses microrganismos se reproduzem como os outros animais, com participação do macho e da fêmea, e não são gerados espontaneamente. Só resta, após isto, conseguir identificar o sexo. 
              Nova dúvida se coloca, quanto à existência dos "pellicelli"; não se sabia se eles seriam a causa da escabiose, ou a consequência do processo de putrefação próprio da doença. Mas novas experiências conseguem confirmar o caráter de agente causador dos animaizinhos e explicar ainda como a doença "pega" tão facilmente. Instalados na pele, os vermezinhos passam facilmente de um corpo para outro. E, como se produzem rapidamente pela deposição de grande número de ovos, fazem com que a doença logo se alastre. 
                 Com o aparecimento dessas novas teorias, no ´seculo XVII, pode-se pensar seriamente na responsabilidade dos pequenos animais, invisíveis a olho nu, pelo elevado grau de contágio de determinadas doenças. O contágio causado por agentes vivos e atuantes passa a ser um fato constatado. 

A Cólera
                   As condições de falta de higiene dos países pobres continuam existindo e matam milhares de pessoas todos os anos. As maiores causas apontados por especialistas são o suprimento inadequado de água e eficiente coleta de lixo, porém, para os políticos, pessoas de baixa renda são apenas número que lhes interessa nas eleições; legalmente compram votos através de benefícios sociais como, por exemplo, o famoso Bolsa Família, que deveria ser emergencial, mas transformou-se  literalmente em forma legal de compra de votos. Portanto é importante que essas comunidades continuem sempre procriando desenfreadamente, pois esses novos moradores são a garantia de seu futuro político. 
                 No século XIX, a cólera era desconhecida fora do Extremo Oriente. A Índia foi o foco original da doença, que se difundiu pela Ásia, chegando depois à Europa e às Américas. O Brasil conheceu-a em 1855, numa epidemia que durou dois anos e matou cerca de 200.000 pessoas. (É importante lembrar que, naquela época, a população do Brasil era um terso da atual). Ela irrompeu no Pará e Amazonas e, posteriormente, atingiu a Bahia e o Rio de Janeiro, onde dizimou, em seis meses, mais de 3.000 pessoas. Outra epidemia foi assinalada em São Paulo, em 1893, difundindo-se depois para o interior, e chegando novamente ao Rio de Janeiro. 
                A primeira pandemia, ataque em escala mundial, verificou-se no ano de 1820. E, em 18545, na terceira vez em que a cólera se espalhava pela Europa, houve 20.000 mortes na Inglaterra e 140.000 na França. Hoje, a doença está praticamente limitada ao mundo subdesenvolvido; entre 1904 e 1923, matou 7 milhões de indianos. (Sempre lembrando que hoje a população mundial é muito maior).  
                 O causador da moléstia é o vibrião colérico, que contamina os alimentos e a água quando os excrementos de uma pessoa afetada estiverem em contado com eles. O vibrião cresce nos intestinos da pessoa infectada, irritando-os, e produz intensa diarreia e vômitos. A pessoa fica desidratada, e o seu plasma sanguíneo pode ser reduzido em dois terços. O sangue torna-se tão concentrado que o organismo deixa de produzir urina e os músculos se contraem, em cãibras violentas.

A Malária
                   Embora receba muitos combates diferentes, a malária continua ceifando vidas. 
                  Por estranho que pareca, ainda há gente que pensa ser a malária uma doença asiática. A denominação da doença, porém, é de origem italiana, onde suas febres características eram atribuídas, pelos religiosos, aos vapores malignos dos pântanos. (em italiano mala aria significa "mal ar"). 
                 Contudo, até agora não foi possível determinar, com precisão,  onde a malária apareceu pela primeira vez. Há registros de sua existência  na Grécia , há mais de 3.000 anos. 
               No Brasil foi a endemia mais disseminada no país, estando agora reduzida e limitada às regiões mais insalubres, notadamente  a Amazônia, seguida dos Estados de Goiás e mato Grosso.
              Entre nós, a doença é conhecida por vários nomes, como maleita, sezão, febre palustre e impaludismo.  Mas seja qual for sua denominação, é sempre a mesma moléstia assassina ou debilitante, transmitida por mosquitos que se reproduzem em charcos ou até mesmo em áreas de água contaminada. 
                Ao picar um indivíduo infectado de malária para alimentar-se do seu sangue, o mosquito ingere os plasmódios ali contidos no sangue da vítima. Chegando ao seu estômago, os parasitos se reproduzem no  quisto. Em seguida passam para as glândulas salivares do inseto e, assim, passa a disseminar a doença nas pessoas que ele pica para extrair-lhe o sangue, seu alimento. 
                   O sintoma mais característico da malária é a febre intermitente provocada pela multiplicação dos Plasmódios no sangue do enfermo. Quando inúmeros desses protozoários completam sua reprodução assexuada, evoluindo sincronizadamente, destroem os glóbulos vermelhos que lhes serviam de suporte e alimento. A principal consequência é que eles, causando a destruição do glóbulos vermelhos, provocam anemia e priva os tecidos de oxigênio. 
              Além de ser uma doença assassina, a malária certamente abre caminho para a instalação de outras moléstias.

Sarampo e Rubéola
                   Embora seja doenças banais da infância, tanto o sarampo como a rubéola podem ser perigosas nos adultos
                    Sarampo e rubéola são moléstias causadas por vírus. Sabe-se que o sarampo foi identificado pelos médicos árabes no século IX, e até cerca de duzentos anos atrás ainda se usavam compostos de excrementos de ovelha em seu tratamento. 
              Visto ao microscópio eletrônico, o vírus do sarampo apresenta forma grosseiramente esferoide. Gosta de temperaturas baixas; a 70ºC abaixo de zero é capaz de sobreviver mais de cinco anos, mas a 56ºC não dura mais do que meia hora. O contágio entre os seres humanos ocorre principalmente através das gotinhas de saliva infectada; perdidas no ar, introduzem-se no trato respiratório. Uma vez instalado no organismo, o vírus leva em média catorze dias "incubado", tempo que aproveita para proliferar, até a pessoa apresentar os primeiros sinais de erupção cutânea. 
                  Mais ou menos no quinto dia após o início dos sintomas, a temperatura atinge o máximo (por volta de 40,5º C)  e surge, então, a terceira fase da moléstia: a erupção cutânea ou exantema.Estas erupções consiste no aparecimento de pequenos pontos vermelhos sobre a pele, usualmente atrás das orelhas. daí se espalham rapidamente pelo roto e depois vão cobrindo o pescoço, o peito e todo o tronco, atingindo finalmente os membros. 
                   Já a Rubéola é uma doença benigna; muitas pessoas nem sabem que a tiveram. mas o que para a média dos adultos pode significar apernas alguns dias de repouso forçado,nas mulheres grávidas apresenta riscos graves.  O vírus atravessa facilmente a placenta e atinge o tecido embrionário, afetando os órgãos em processo de formação. 
                Embora a rubéola tenha sido identificada  na Alemanha na segunda metade do século XVIII, só em meados do século XIX é que se reconheceram suas epidemias na Inglaterra e nos EUA. A origem virótica da moléstia foi sugerida em 1938, mas a confirmação do vírus só se deu em 1962. 

A tuberculose
               Há menos de um século, a tuberculose matava mais pessoas na Europa do que qualquer outra doença. Mesmo hoje, e também em países desenvolvidos como os estados Unidos, milhares de casos insuspeitos de tuberculose resultam em centenas de mortes anuais. No passado acreditava-se que artistas, poetas e músicos eram mais vulneráveis á tuberculose, devido às tensões do seu gênio. Na verdade a causa de sua vulnerabilidade estava nas condições da vida que levavam. A doença ainda é mais comum em pessoas que vivem amontoadas em ambientes insalubres, entre gente mal alimentada. Nas áreas mais pobres das grandes cidades e nos presídios, por exemplo, a tuberculose é uma ameaça considerável. A causa da TB é uma bactéria, a Mycobacterium tuberculosis, geralmente inaladas em perdigotos (gotículas de saliva contaminadas com o vírus) lançadas por pessoas contaminadas. Também pode ser transmitida por uma vaca, vítima da forma bovina da doença. O leite dessa vaca é outra forma de infecção. 
               Os bacilos da tuberculose, ao penetrarem nos pulmões, provocam uma pequena lesão no tecido pulmonar. Quando os organismos são levados pela bebida ou pela comida, a primeira lesão ocorre no canal alimentar; em casos muito raros, a bactéria penetra na pele. 

Varíola e Varicela
                 Uma das primeiras guerras biológica de que se tem notícia foi promovida pelo colonizador branco na América: a transmissão intencional da varíola para o nativo, através da doação de "presentes" contaminados com a doença.  
              Os brancos tiravam partido do conhecimento de dois fatos: a extrema vulnerabilidade do índio a uma doença inexistente no Novo Mundo e o assustador caráter endêmico que ela representava no Velho Mundo. Embora a designação "peste" englobasse indiscriminadamente as epidemias de cólera, tifo, escarlatina e varíola que dizimaram populações européias da Idade Média e renascença, sabe-se hoje que os surtos de varíola foram os que mais vítimas fizeram durante aquelas épocas. 
             O pavor que a doença inspirou deve-se não só ao seu caráter altamente contagioso, mas também aos terríveis sintomas. 
              A varíola é provocada por vírus - organismos tão pequenos que não podem ser vistos pelo microscópio comum. Os da varíola, chamado Poxvírus variolae,podem se multiplicar em apenas uma célula, mediante alteração, em seu favor, do processo celular de metabolização de proteínas e ácidos nucleicos. Este rearranjo químico acaba por romper a célula, comunicando-se às outras, e alastrando-se, assim, pelo resto dos tecidos. 
               O vírus penetra no organismo através da respiração - gotículas espalhadas pelo ar. Logo as glândulas linfáticas são infectadas e pouco tempo depois o Poxvírus variolae já pode ser detectado no sangue. 
                Em 1796, Edward Jenner realizou a primeira vacinação antivariólica, após ter notado que a infecção por varíola bovina protegia pessoas da varíola. Após inocular um garoto de oito anos com o líquido de uma pústula de varíola bovina. Com isso ele descobriu que era impossível fazer a criança, assim inoculada, contrair a varíola.
                 Já a varicela é menos perigosa, e a maioria das pessoas já a tiveram na infância. Ela tmbém é provocada por um vírus. 

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quinta-feira, 14 de maio de 2020

A GUERRA DO ÓPIO ENTRE CHINA E INGLATERRA



                
                Para iniciarmos este estudo é importante saber o que é o ópio.
               O ópio é uma palavra grega (ópion); no latim(opiu) e quer dizer suco de papoula. Dela se pode extrair muitas substâncias farmacológicas; também chamada de "Papyer Somniferum" é muito conhecida como a Papoula do Oriente. Hoje muito produzida no Afeganistão que a produz e exporta como droga. Em muitos países subdesenvolvidos, muitas vezes por falta de opções os camponeses  são levados a trabalhar no cultivo de plantas (hoje consideradas ilícitas) como a papoila, que está na base da produção industrial do ópio. 
               O uso do ópio mascado ou fumado, que se espalhou no Oriente, provoca euforia, seguida de um sono onírico; o uso repetitivo conduz ao hábito, à dependência química, e a seguir a uma decadência física e intelectual, uma vez que se trata de um veneno  estupefaciente. Os alcaloides que ele contém é largamente utilizado na medicina (morfina e papaverina), como sonífero analgésico. 
              Pois foi exatamente esta bela flor que provocou uma guerra, no início do século XIX  entre os chineses e ingleses.
                 A Índia e a China, extremamente populosas, exerciam enorme atração sobre os mercadores ingleses. Mas, enquanto a Índia comerciava abertamente, o Governo chinês não demonstrava interesse algum pelas mercadorias européias. Os negociantes ocidentais adquiriam na China artigos como seda, porcelana e, principalmente chá, que alcançavam bons preços na Europa. Mas não conseguiam colocar nenhum de seus produtos. O comércio sí sofria muitas restrições. Somente duas cidades podiam entrar diretamente em contato com os mercadores estrangeiros: Cantão e Ourga. E todas as operações comerciais deviam ser feitas através de determinados negociantes chineses: os co-hong.
             Esse comércio limitado, unilateral, era pouco rendoso para a Inglaterra, e isso desequilibrava a balança entre os dois países. A compra de mercadorias  chinesas absorvia asa reservas britânicas de ouro. Os ingleses estavam viciados em chá e não podiam mais ficam sem ele. Por outro lado, sem vender seus produtos, os ingleses não eram compensados. 
            Só um produto comerciado pelos mercadores ingleses tinha grande aceitação entre alguns chineses: o ópio, narcótico extraído das papoulas, que produz efeito adormecedor sobre o cérebro, mas vicia. 
               A Companhia das Índias cultivava, então, o ópio na Índia e incrementava o seu consumo na China, vendendo-o em grandes quantidades a mercadores chineses independentes. 
              Inicialmente era permitido uma pequena importação de ópio, mas em 1800, o governo Chinês percebeu que 20% do seu povo estava sendo completamente viciado e proibiu tal comercio. 
                Mas os números demonstravam que mesmo com o contrabando, que logicamente encarecia o produto, era muito compensador, e os chineses continuavam se viciando cada  dia mais. Em 1831, o comércio oficial de cantão não ia além de 7 milhões de dólares, e o comércio paralelo (ilegal), na ilha de Lintim, atingia 17 milhões, onze dos quais referentes á venda de ópio. 
               O comércio de ópio tomava proporções alarmantes, assustando o imperador chinês.
               A primeira iniciativa foi tomada enviando uma mensagem á rainha da Inglaterra que assim se expressava: ""-Pensamos que essa substância perniciosa é fabricada clandestinamente por artifícios maquinadores que dependem de vossa nação. Seguramente, Honrada Soberana, vós não ordenastes e cultura e a venda dessa planta", escrevia o Comissário Extraordinário do imperador chines à rainha Vitória, que governava a Inglaterra naquele ano de 1839. 
              A Companhia das Índias Orientais possuía o monopólio do comércio com o Oriente desde 1733. Mas, em 1833, o Parlamento Inglês retirou-lhe esse direito. As relações comerciais com a China entravam, portanto, em nova fase, e precisavam  ser novamente regulamentadas. Nessa oportunidade o vice-rei de Cantão, por intermédio dos co-hong, pediu aos diretores da Companhia que nomeassem, como no passado, um chefe conveniente para vir a Cantão organizar as trocas comerciais. O governo britânico designou o Lord Napier, que não aceitou os co-hong como intermediários; queria que os negociantes ingleses desfrutassem, na China, de ampla liberdade de comerciar. 
             Aguçavam-se as divergências: os ingleses teimavam em ampliar suas vendas, enquanto os chineses se abstinham das transações consideradas desnecessárias. 
             Diante da Obstinação de Lord Napier, o vice-rei de cantão percebeu numa proclamação a insistência dos ingleses. Ordenou, portanto, aos empregados da feitoria de cantão  que a abandonassem imediatamente, proibindo à população, sob pena de morte, o fornecimento de víveres aos ingleses. Para certificar-se de que as ordens estavam sendo cumpridas, enviou tropas à localidade. 
             Lorde Napier tinha uma frota inglesa á sua disposição e ordenou o desembarque de um destacamento para proteger o direito ao comércio. O vice-rei de cantão respondeu à violação cercando o destacamento inglês. Lord Napier, reconsiderando sua atitude, retirou-se com a frota para Macau. 
             Apesar da calma aparente, os ânimos estavam exaltados. As cartas que Lord Palmerston (o membro mais importante do Gabinete Inglês de Assuntos Estrangeiros) recebia de Napier descreviam as atitudes chinesas como "castigo" infligido à Inglaterra, e recomendavam que jamais se negociasse m com os chineses, sem ameaçá-los. 
             Resolvido a combater energicamente o envio de ópio para seu país, o soberano chinês nomeou Lin Tse-Hsu para Comissário Imperial Extraordinário, dando-lhe, inclusive, a prerrogativa de Grande Almirante. Investido de plenos poderes, Lin Tse-Hsu ordenou aos mercadores chineses independentes que extinguissem o tráfico, exigindo-lhes a entrega de 20 mil caixas de ópio inglês. Numa cerimônia pública queimou todo o ópio apreendido, demonstrando ao povo chinês o quanto o Governo abominava aquele vício. Foi por essa ocasião que o Comissário Imperial escreveu à rainha Vitória, supondo que o governo inglês ignorasse o contrabando. Mas estava enganado; aquele governo apoiava integralmente o tráfico dessa poderosa droga que destruía a saúde e a vida de 20% dos chineses. 
              Desde 1773 vigorava na Inglaterra a "Lei de Regularização", pela qual a Companhia das Índias Orientais ficaria sujeita à administração de um governador nomeado pelo Parlamento inglês e sua contabilidade era também submetida ao exame do Tesouro real. Portanto, o Parlamento tinha perfeito conhecimento do tipo de comércio exercido pela Companhia. 
             O estopim da guerra foi o assassinato de um súdito chinês por marinheiros ingleses embriagados. O Comissário Imperial exigiu que o criminoso lhe fosse entregue, e o Superintendente inglês recusou-se. Indignado com o desrespeito à autoridade imperial, Lin Tse-Hsu ordenou ma expulsão de todos os ingleses de cantão. Era o fim das esperanças de expansão comercial. Imediatamente a Inglaterra respondeu com o bombardeamento de Cantão, marcando o início da "Guerra do Ópio", em março de 1839. 
                 Os modestos juncos chineses, barcos movidos a vela, não podiam oferecer grande resistência á frota inglesa, composta de possantes veleiros clíperes, fragatas e navios mercantes.  Sob o comando co Capitão Elliot, e mais tarde do Almirante William Parker, as forças britânicas tomaram portos importantes da costa chinesa. Em 21 de janeiro de 1841 apossaram-se da ilha de Hong-Kong, na região sudeste, de extrema importância estratégica. Não demoraram cair as cidades de Amoy, Tighai e Chusan.  Em 13 de junho do ano seguinte os ingleses ocuparam Xangai e ameaçam Pequim. 
            Vendo-se derrotados, em 29 de agosto os chineses assinaram o Tratado de Nanquim. O acordo regia, pelo espaço de 100 anos, as relações comerciais da China com o Ocidente. Cinco portos foram abertos aos ingleses: Xangai, Ningpo, Fu-Tcheu, Cantão e Amoy. Garantindo o direito de comércio, em cada porto estaria constantemente ancorada uma belonave britânica. Foi abolido o monopólio dos co-hong, a China foi obrigada a pagar indenização pelo ópio inutilizado e a ceder Hong-Kong. 
             O fim da Gerra do Ópio garantia á Europa, principalmente à Inglaterra, vasto mercado para a colocação de seus produtos. 
               Conhecendo a história fica mais fácil entender porque existe tantos ressentimentos dos chineses contra alguns países. Também podemos perceber que o tráfico de drogas não é um crime praticado apenas por bandidos; muitas vezes tem algum poder estatal por traz. 
               Hoje as drogas mais traficadas são a maconha e a cocaína, mas não pensem que isso continua porque os governos não conseguem vencer os traficantes; eles simplesmente não querem essa vitória.  
As Papoulas

                Dentre as flores que desabrocham nos campos de trigo, quando as messes já se mostram louras e maduras, há uma que, pela sua viva cor, parece mais satisfeita que as demais, em festejar a proximidade da ceifadeira. Esta é a papoula, uma planta que os camponeses não desejariam nunca ceifar devido ao vermelho vivo  de sua corola, que contrasta com o negro dos pistilos, possui uma das mais belas flores, uma das mais vivazes de quantas florescem em estado espontâneo entre o trigo, embora para eles fosse inútil. 
               A papoula (papaver rhoeas) é uma planta daninha, muito comum na Europa, na Ásia menor e na África Setentrional. Nos países mediterrâneos, da mesma família, são conhecidos o "papaver alpiunum", de flores brancas ou cruzadas que cresce nos declives dos Alpes e dos Apeninos, o "papaver hybridum" e o "!papaver dumbium", todas espécies estas que, tal como a papoula comum, brotam espontaneamente e que, com ela, tem em comum, mais ou menos variadas, a estrutura da haste e das folhas, o número e a forma das pétalas, a conformação capsular do fruto (chamado cápsula ou cabeça de papoula) e as sementes oleígenas. Outra espécie, os "papaverum somníferum" ou dormideira, em suas variedades "album", e "nigrum", é, para os homens, uma coisa bem preciosa, mas, também, infelizmente, bem mais perigosa. Essa planta, que não conhecemos em cultura espontânea, é cultivada, desde há muito, em toda a Ásia e na Europa, mas, talvez depois dos ensinamentos quanto ao emprego dela faziam os Hindus, os Persas e os Chineses, já no século XV, adquiriu inúmeros cultivadores em terras mais civilizadas. 
                 O "papaver somniferum" ama as localidades cálidas e, sem vento, é planta anual, que cresce rapidamente (na Europa, é semeada em fevereiro-março e suas flores aparecem em maio) destaca-se dos demais pelas enormes e cândidas flores e sua altura incomum, que pode alcançar metro e meio Quando as pétalas caem e os frutos começam a amarelecer, o cultivador, sem arrancá-los da planta, pratica nas cápsulas uma longa incisão, de onde brota um látex de cheiro nauseante, que, ao contato com o ar, logo escurece e se contrai e que será apresentado ao comércio, manipulado com folhas de papoulas, sob o nome de "OPIO". O ópio, mais abundante na variedade "álbum", contém muitas substâncias, e de vários efeitos (morfina, laudanina, codeína,tebaína etc.) que, se usadas em doses mínimas e separadamente, constituem um medicamento indispensável para certas doenças nervosas (insônia, hemicrania, cólica, tosse etc.), mas que, quando administrados em doses excessivas, conduzem, inevitavelmente, o indivíduo à loucura e, mesmo, à morte. 
               Por esta razão, e por iniciativa de Teodoro Roosevelt, então presidente dos Estados Unidos, na Conferência de Haia em 1912, os países europeus, americanos e asiáticos estabeleceram um controle atentíssimo, na cultura da papoula, e limitaram a produção do ópio unicamente às necessidades farmacêuticas, condenando, com leis severíssimas, aqueles que fizerem, ilicitamente, uso dele ou o expuserem à venda. 
              As sementes do "papaver" somniferum" são comestíveis; na Europa, mediante processos especiais (moenda das sementes e sucessivo esmagamento de sua farinha em prensa) extrai-se a substancia oleosa de que são riquíssimas e a qual, oportunamente refinada, é posta, depois, à venda sob o nome de "óleo de sementes". 


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quarta-feira, 13 de maio de 2020

A EUROPA DEPOIS DA REVOLUÇÃO FRANCESA




             Entre 1755 a 1810 o mundo ocidental viu-se agitado por movimentos liberais. Buscavam mudar a ordem estabelecida pelos governos de caráter absolutista, ou tornaram-se independentes de certas forças tutoras aristocráticas, com é o caso da Suíça. Em um e outro lado do oceano, a Revolução estendeu-se como uma onda difícil de frear. Esses movimentos inspiraram-se nas ideias iluministas, especialmente nas expressadas por Rousseau. Além disso, o sistema absolutista estava passando por uma profunda crise. Sua queda apresentou-se praticamente como inevitável. Esta época ficou conhecida como a Era das revoluções. 
                Durante todo o desenvolvimento da revolução, o povo parisiense teve um destacado papel. Apesar de não participar diretamente no governo da França revolucionária, suas manifestações influenciaram marcadamente as decisões políticas. 
               No dia 14 de julho de 1789 o povo tomou de assalto a fortaleza da "Bastilha". Este edifício foi construído no século XIV e era o baluarte do absolutismo e um símbolo do Antigo Regime. Segundo alguns autores, os revolucionários pretendiam apoderar-se das armas que se encontravam no edifício. Entretanto, estas não existiam, e a importância do fato reside no seu simbolismo. Este acontecimento é recordado a cada 14 de julho,que é o dia nacional da França.
                    Enquanto na França a queda da monarquia se delineava bem próxima, o crescente rumor do tumulto popular chegava a abalar os soberanos da Europa, dentro das paredes seguras de suas cortes. Estava patente, já a todos, como as ideias de liberdade e de igualidade, que até então tinham sido consideradas somente como interessantes proposições filosóficas ou projetos utopistas de inocentes eruditos, tinham calado no ´[intimo do povo, a quem séculos de ignorância e servidão não haviam privado de capacidades lógicas e de aspirações a uma sociedade melhor: o povo havia-se rebelado, tornara suas as doutrinas dos reformadores iluministas, interrompendo-as segundo as próprias possibilidades e os próprios interesses, compreendera que havia sofrido, durante inúmeras gerações, uma colossal série de injustiças e estava firmemente decidido a por-lhe cobro no mais breve tempo possível. O ruir da Bastilha provocara, em toda a Europa, ecos sinistros; urgia por um paradeiro em tempo à maré avassaladora, para que, depois de haver submergido, na França, todos os vestígios da velha ordem, não extravasasse além das fronteiras. Áustria e Prússia puseram-se em movimento, certas de que derrotariam facilmente uma nação que parecia presa da mais ampla anarquia; vive-versa, não fizera mais do que apressar a obra de reorganização dos órgãos centrais franceses que, diante do perigo comum, encontraram a nação mais firme do que nunca. O exército, isto é, o povo, não combatia mais, como no passado, contra inimigos desconhecidos e por motivos que ele ignorava; cada soldado tinha a sensação de bater-se pela sua casa e por aqueles direitos que acabara de conquistar. A Assembleia Constituinte da França terminara seus trabalhos em setembro de 1791; e a ela sucedera a primeira Assembléia Legislativa que, todavia, não parecia estar em condições, seja pela estatura política de seus expoentes, seja pela natureza de suas relações com o soberano, de assegurar firme direção ao país. Já a situação, doutro lado, fugia sempre mais ao controle central; de todos os lados, surgiam pequenos ditadores locais, as massas populares obedeciam aos demagogos que as manobravam e atiravam-se, com cega violência, ora ora numa ora noutra direção, segundo o bafejo dos ventos políticos mutáveis. 
                  Em 20 de junho de 1792, a Europa assistira incrédula o povo atacando em massa os palácio das Tulherias, e os verdadeiros responsáveis pelo Estado não mais podiam mover um dedo para detê-lo. Com fúria bestial, a plebe transpôs portas e portões, interrompeu os átrios, massacrou os Suíços que residiam, fiéis às ordens recebidas, matou os heroicos oficiais da Guarda, que tentavam, sozinhos, deter a avalancha. Pelas ruas de Paris, enfurecida a selvagem represália da Comuna, que prendia e mandava para a guilhotina centenas de pessoas, sob a acusação genérica de "inimigos do povo". 
            A coerência ideológica e administrativa diferenciou  o império dos demais então existentes, em especial o dos Habsburgos e o Otomano. Para os habitantes da França, Itália, Alemanha, Espanha e Países baixos, significou uma nova e frequentemente traumática experiência de viver em um Estado moderno.
               Todo esse movimento permitiu o surgimento de um grande militar: Napoleão Bonaparte. Quando tornou-se primeiro cônsul e chefe da República Francesa em novembro  de 1799, Napoleão tinha apenas 30 anos. Aos 28 já era general do exército revolucionário, ascensão facilitada pelo caos reinante da guerra contínua entre a França e a aliança de potências anti-revolucionárias, lideradas pela Grã-Bretanha, Áustria e Rússia.
                A contribuição mais importante de Napoleão Bonaparte para a história da Europa moderna não reside na sua brilhante carreira militar, mas na criação, na Europa Ocidental, de um império governado segundo preceitos introduzidos pela Revolução Francesa. Porém, Napoleão demonstrou audácia e habilidade política, explorando suas vitórias militares no norte da Itália em 1796/7. Desenvolveu uma linha pessoal e eficaz de ação diplomática, negociando a paz com os austríacos derrotados. Assim, criou no norte da Itália a República Cisalpina. Apoiado numa reduzida classe social de italianos patriotas pró-franceses e, quando possível, em abastados proprietários rurais, o novo Estado de Napoleão buscava seguir o modelo da França republicana. Desde o início de sua carreira política, a essência do pensamento de Napoleão previa a imposição das instituições francesas nas áreas que passava a controlar. 
                Em 1799, Napoleão chegou  ao poder da França por meio de um golpe organizado por políticos influentes com o propósito de reforçar, e não destruir, o moderado regime republicano que governava a França desde 1795: o Diretório. Quatro anos depois os acontecimentos militares viraram-se contra a França e os políticos republicanos temiam que o regime não resistisse a outra derrota militar ou ao ressurgimento da contra-revolução. A elite política, temendo a restauração do republicanismo extremado, com a reeleição do terror, optou por um executivo mais forte centrado no exército. 
              O general Napoleão Bonaparte tinha, então, 31 anos de idade; nasceu na Córsega e alcançou a fama conduzindo as forças revolucionárias francesas em um ataque relâmpago sobre o norte da Itália, além de invadir o Egito. Seu governo autocrático como primeiro cônsul (1799 x 1804) e como imperador (1804 x 1814) foi aceito pelo povo francês depois do caos do último período da revolução. Durante seus primeiros anos no poder justificou as esperanças  de um governo sadio ao introduzir medidas que formariam o alicerce permanente da maioria das instituições francesas Uma lei administrativa de 1800 reorganizou os departaments pelos quais a revolução dividiu a França, reduzindo o poder de seus conselheiros eleitos localmente e colocando um prefeito para representar a autoridade central em cada parte do país. A "Concordata" de 1801 pôs fim à disputa surgida entre a França revolucionária e a Igreja. O Estado tomava controle dos bens temporários da Igreja enquanto o papa se limitava à direção espiritual. A lei da educação de 1801 criou as escolas secundárias estatais, nas quais havia bolsas de estudo e onde a educação estava orientada para a formação de funcionários e oficiais do Exército capacitados. O Código Civil de 1804 teve ainda melhor recepção entre os franceses, sendo mais tarde conhecido como "Código Napoleônico", confirmado a igualdade perante a lei e os direitos de propriedade emanados da Revolução. Permitiu-se aos membros da antiga nobreza compartilhar os benefícios desta legislação, desde que aceitassem o novo regime. Napoleão consolidou a tal ponto os objetivos mais concretos da revolução, que estes se tornaram inalteráveis inclusive depois de sua queda, ainda que, ao  fazê-lo substituísse  a liberdade individual pela eficiência como objetivo do esforço humano. As funções do Parlamento reduziram-se ao mínimo e a atividade administrativa ocupou o lugar da política. A França passou a ser um país de lavradores e proprietários agrícolas, com o pesado fardo de uma burocracia na qual os homens talentosos podiam competir por postos e recompensas. 
             Logo a elite militar uniu-se aos burocratas, porque a paz que Bonaparte conseguiu no princípio de sua carreira durou pouco e entre 1803 e 1814 esteve constantemente em guerra. Os exércitos franceses, que haviam mostrado seu potencial durante a Revolução, alcançaram seus maiores resultados devido ao gênio administrativo e brilhante liderança de Napoleão como general. Ao abandonar a antiga estratégia militar do cerco, Napoleão procurou derrotar as forças inimigas no campo de batalha depois de manobrar melhor que elas para dividi-las e com isso superá-las em número. Conseguiu vitórias avassaladoras sobre a Áustria, em Austerlitz (1805); Prússia, em Iena (1806); e Rússia, em Friedland (1807), dando-lhe a supremacia na Europa. Uma invasão relâmpago da espanha em 1808 trouxe uma força naval expedicionária britânica a La Coruna, e novamente as hostilidades austríacas em 1809 produziram outra rápida vitória dos franceses em Wagram. Os êxitos militares foram acompanhados por uma agressiva diplomacia. Anexavam-se os territórios na fronteira com a França; a Suíça passou à "proteção" francesa; os príncipes governantes da Alemanha Ocidental aliaram-se a Napoleão em troca da expansão de seus estados; a Espanha, o nordeste da Itália, Nápoles e Westfália transformaram-se em reinos- satélites dirigidos por membros da família Bonaparte; as terras polonesas arrebatadas da Áustria e Prússia receberam como grão-duque um candidato nomeado por Napoleão. Somente a Áustria e a Prússia, muito menores, conservaram uma precária independência junto à enigmática Rússia.
            Napoleão nunca estava satisfeito, e insistiu que todos os seus governantes títeres, inclusive os mais distantes, estabelecessem instituições no estilo francês, caso houvesse alguma possibilidade, e adotassem seu código. Sua intenção era levar a cabo uma revolução social nas regiões mais retrógradas, como a Polônia, e também aproveitar os recursos de todo o império às necessidades da França. O êxito das novas instituições para criar uma sociedade fundamentada na riqueza e no mérito, e não em convenções e privilégios , foi maior nos Países Baixos, nas regiões às margens do reno e no nordeste da Itália, onde, por muito tempo, o feudalismo vinha desmoronando e os exércitos da Revolução Francesa assentavam as bases das idéias francesas, mas em nenhuma parte o resultado foi desprezível. Além disso, a influência de napoleão não se limitou ao continente europeu. Suas reformas, de inspiração secular e, portanto, não ligadas ao cristianismo, foram adotadas como modelo por Maomé (Mohammed) Ali, do Egito, e pelo sultão otomano Mahmud II no século XIX. O "Código Napoleônico" passou a ser modelo às reformas legais na América do Sul e no Japão. 
              Por sorte, para Napoleão, praticamente não existia nessa época um sentimento nacional na Alemanha nem da Itália. Apesar do ressentimento criados pelos abusos econômicos da França, muitos jovens dos territórios anexados ou aliados valorizavam as oportunidades de fazer carreira que foram abertas através das instituições napoleônicas e com a fusão de Estados insignificantes em unidades territoriais maiores. 
              Estas campanhas, que terminaram com uma aliança instável entre a Rússia, na "Paz de Tilsit", em 1807, estenderam o domínio francês à Europa Central. Nessas áreas foram criados reinos satélites; os Grão-Ducado de Berg, governado pelo próprio Napoleão; o Reino de Westfália, administrado por seu irmão, Jerônimo; o Grão-Ducado de Varsóvia; uma limitada restauração da Polônia; na Itália, enquanto o Reino de Nápoles ficou sob as ordens de seu irmão mais velho, José, restou a Napoleão o governo do Reino da Itália, ao norte. Luiz, outro irmão Bonaparte, tornou-se rei da Holanda, reino instituído em lugar da República Batava, o mais antigo Estado-satélite da França. 
           Tais governos presenciaram tentativas de introdução dos aspectos mais importantes do sistema administrativo francês. Na prática, isto significa investidas contra os privilégios feudais da nobreza, a posição ocupada pela igreja na sociedade e as arraigadas tradições nacionalistas. Reformas de inspiração francesa foram também adotadas nos pequenos Estados alemães leais a Napoleão: Baviera, Baden, Württemberg, Nassau e Saxônia.        
             Em 1807, a tentativa de derrotar a Grã-Bretanha levou a expansão francesa à fase seguinte, com consequências desastrosas. Para executar o plano de guerra econômica contra a Grã-Bretanha (o sistema continental) Napoleão foi levado a realizar novas anexações entre 1808 e 1811, primeiro na costa do mar do Norte, até Hamburgo, e na Itália Central - Toscana e Estados Papais. As exigências do bloqueio também o forçaram a intervir diretamente na Espanha, onde em 1808 foi criado um novo reino satélite sob a tutela de seu irmão José. Murat, cunhado de napoleão, assumiu o governo de Nápoles. Essas anexações não foram tranquilas como as anteriores, mas constituíram um império exterior, onde as instituições francesas não chegaram a se tornar uma realidade e as reformas foram combatidas. Na Espanha a extensão do território e a presença de um exército britânico em Portugal dificultaram a ocupação militar francesa, disseminando a resistência armada da população. Nos Estados Papais, a deposição do papa não só causou a excomunhão de Napoleão, mas gerou uma resistência passiva em massa à introdução de instituições francesas de governo. na costa do mar do Norte, o contrabando, fomentado pela Marinha britânica, atingiu proporções alarmantes. As resistências à convocação militar geraram um banditismo quase generalizado. Em 1809, o Estado-cliente da Baviera defrontou-se com uma revolta popular no Tirol, provocada pela introdução de uma série de reformas de modelo francês; na Itália Central e em áreas rurais perto de Veneza, irrompiam diversas rebeliões, embora sem coordenação. A única resistência popular importante á invasão francesa partiu da Espanha, onde a guerra de guerrilhas dos camponeses incentivou um exército britânico sob o mando de sir Arthur Wellesley (depois duque de Wellington) a desembarcar em Portugal em 1809 e abrir caminho lutando pela Espanha até o sul da França em 1813. Os principais inimigos de Napoleão no continente europeu foram os reis dinásticos da Áustria, Prússia e Rússia. os três, por conveniência, aliaram-se em algumas oportunidades a Napoleão, mas a ambição insaciável deste último levou-o, finalmente, a invadir a Rússia em 1812, e sua derrota fez com que os três  monarcas se unissem contra ele. O dinheiro para manter as forças militares desta aliança provinha basicamente da Grã-Bretanha, o inimigo mais persistente da França. 
              Quando Napoleão lançou a desastrosa invasão da Rússia, em 1812, motivada pela recusa do czar em apoiar o bloqueio anti-britânico, a hegemonia francesa ficou seriamente comprometida em todo o império, com exceção do seu núcleo interior - a própria França, a Renânia e o noroeste da Itália. Mas em 1814 até mesmo a França , exaurida financeiramente e esgotada pelo esforço do bloqueio, voltou-se contra napoleão. Seu breve e audacioso retorno ao poder, em 1815 - os cem dias - terminou com uma fragorosa derrota para os aliados, em Waterloo, embora sua impopularidade na França tenha sido transitória. 
             O rápido colapso do sistema estatal napoleônico entre 1812 e 1814 não é capaz de encobrir a influência fundamental da administração francesa na evolução da Europa moderna. Até mesmo adversários do imperialismo francês na França Ocidental abraçaram os princípios que norteavam suas reformas e não escondiam a admiração pela eficiência do estado napoleônico. Os liberais espanhóis, enquanto resistiam ao cerco francês ao porto de Cádiz, redigiram uma Constituição de inspiração francesa. No início do século XIX, reformistas espanhóis, alemães e italianos conceberam o estado moderno em termos essencialmente napoleônico. Por outro lado, a população européia aprendeu a desconfiar deste mesmo modelo, identificando-o com o serviço militar obrigatório, ateísmo e opressão. O período entre 1799 e 1814 presenciou o surgimento de um conjunto de situações que o "Congresso de Viena" não conseguiu eliminar. 
Tentativa de revolta na Polônia
         O século XIX assinala, em todo o mundo, o despertar do espírito nacional e independentista. A Bèlgica também, numa breve  e quase incruenta revolução, que é apoiada pela França e pela Inglaterra, torna-se independente da Holanda.  
            As nações que não possuem limites naturais bem definidos - essencialmente, mares ou cadeias montanhosas - estão sujeitos, mais do que as outras, a invasão, desmembramentos, reivindicações de territórios de parte dos vizinhos. Casos típicos, na Europa, são oferecidos pelo contínuo remanejamento de fronteiras entre os povos de língua alemã, pelas repetidas invasões sofridas pela Hungria, pelos retalhamentos da Polônia. Esta última, especialmente, situada sobre uma interminável planície, cujos únicos pontos firmes são os rios, todos vadeáveis, e algumas baixas gibosidades colinosas, circundada como é por poderosos e belicosos vizinhos, Russo a oriente, Alemães a ocidente, Austro-Húngaros ao sul, tem sido objeto, no decorrer dos três últimos séculos, de tantas cobiças e de tão repetidos desmembramentos, a ponto de não ter nunca conseguido assumir um configuração territorial estável. Quando subiu ao trono Estanislau Poiatowski, o protegido da Rússia, na constituição polonesa, foram efetuadas algumas reformas, mas, que a mutação dos tempos aconselhava com urgência. O País, de fato, era dirigido por um regime marcadamente feudal, no mais restrito sentido da palavra. As reformas, como sempre acontece, provocaram descontentamentos; disso se aproveitou a Rússia para intervir com aspereza e restaurar as condições precedentes. 
           A violência, ainda exercida por vias diplomáticas, irritou os patriotas poloneses, provocou a formação de bandos armados e, afinal, mergulhou o país na guerra civil, além do conflito com a Rússia. Acreditando ter chegado a ocasião favorável, a Turquia, por sua vez, atacou o império do Tzar, mas sofreu uma série clamorosa de derrotas, que a Áustria, preocupada em ver a Rússia tornar-se senhora do Oriente Médio e dos Balcãs, impeliu Catarina a abandonar suas conquistas meridionais, o que, cedo ou tarde, teria provocado intervenção de toda a Europa, e a compensar-se sobre a Polônia. Esta foi, então, repartida em três partes, que Áustria,Rússia e Prússia dividiram entre si como bons amigos. O governo polonês ficou nominalmente senhor de cerca de dois terços do território (nominalmente, porque, na prática, recebia ordens de Moscou). Como se vê, o hábito de tratar os povos como mercadoria de troca estava no auge também no século do iluminismo. Tudo isto aconteceu em 1772. Cerca de vinte anos depois, uma aliança de países da Europa contra a Rússia dava aos Poloneses a possibilidade de reafirmar a própria independência; mas foi um escasso sucesso, porque, um ano depois, a Rússia anexava a si, com a violência, metade do país, impondo de novo sua vontade ao governo de Varsóvia. Não ainda conformados, os poloneses insurgiam-se, pouco depois, em 1794, sob o comando do general Kosciusko, valente defensor da independência e um dos heróis da guerra de libertação americana. Mas, Rússia, Áustria e Prússia caíram-lhe logo em cima. Infelizmente, o valor e a justiça de uma causa por que se combate, em geral, nada podem contra a esmagadora superioridade de forças. 
          A legião polonesa chocou-se contra  o enorme exército russo, comandado pelo feroz ma hábil Suvarov, e foi derrotada. Kosciuszko, ao tombar ferido de morte, teria exclamado: "Finis Poloniae!" como para significar que, com ele, se extinguia o último hálito de independência.  De fato, a Polônia foi, em 1795, definitivamente repartida entre os vencedores e desapareceu do rol das nações livres. A morte de Kosciuszko, na batalha de Maciejowice, assinalou o fim da revolta polonesa e de qualquer esperança de sacudir o jugo estrangeiro. Repartida entre a Rússia, a Prússia e a Áustria, a Polônia, pouco depois, desaparecia da carta geográfica, seus patriotas partiram para o exílio e,por mais de um século, a nobre nação teria que suportar o peso não leve do governo tzarista. Sabemos com o Napoleão, ao aproximar-se do Vístula, suscitou as esperanças dos Poloneses que, por um momento, viram nele o provável libertador; como um corpo de Poloneses, comandado por um Poniatowski (sobrinho de Estanislau), participasse da expedição à Rússia, foi literalmente destruído durante a retirada. Em 1815, o Tzar Alexandre proclamou-se rei da Polônia e, pelo menos inicialmente, pareceu disposto e inclinado a conceder uma certa liberdade (compatível com a concepção algo restrita que os Russos tinham da liberdade), as bem cedo se demonstrou tão reacionário e duro quanto os seus predecessores, e as sociedades secretas começaram a surgir, na Polônia, bem como nas demais nações européias submetidas ao domínio estrangeiro. 
            Na Itália, na Grécia, na Espanha, os liberais e os independentes levantaram-ser; as revoltas, exceto a grega, foram logo sufocadas, mas já indicam, agora, a quem sofre o jugo da Santa Aliança, que os tempos estão maduros. Em 1830, os Franceses sacodem o absurdo jugo de carlos X; pouco depois, os Belgas, com a ajuda da França e da Inglaterra, tornam-se independentes da Holanda; confiando talvez no auxílio estrangeiro e no bom senso dos Russos (Alexandre I falecera em 1825), os poloneses revoltam-se e atacam o palácio do governador, que a muito custo consegue salvar-se da ira popular. Mas esta também, como todas as outras revoltas polonesas, estava destinada a permanecer estéril de qualquer duradouro resultado. O primeiro sucesso, bem explorado, teria podido causar a expulsão, pelo menos parcial, dos Russos, naqueles momentos, militarmente exaustos por uma das habituais guerras contra os Turcos. Entretanto, as primeiras vitórias foram seguidas por inexplicáveis contemporizações e por inúteis manobras diplomáticas, de modo que, poucos meses depois,os Russos podiam reorganizar suas forças e abafar definitivamente a revolta. Os cárceres, então, encheram-sede patriotas, os patíbulos e os pelotões de execução trabalharam a fundo. E uma vez mais a tirania triunfara sobre as ideias de liberdade. 
Restauração da Monarquia na França
                Depois de Napoleão I foi restaurada a Monarquia. Luiz XVII, surgido na França graças aos exércitos russo, ingleses e prussianos, encontrava-se, debelado o último reduto bonapartista, às voltas com uma situação não muito simples nem feliz. Atrás dele tinham voltado os emigrados, que haviam acumulado, em vinte anos de exílio, um ódio irredutível por tudo quanto soubesse, ainda que muito distante, a democracia, direitos dos homem e assim por diante; reentravam, muitos deles, para vingar-se daqueles que lhes guilhotinaram os parentes, lavar as humilhações, reconquistar os bens desapropriados. A burguesia, tornada muito forte sob o império iluminado de Napoleão e agora único e verdadeiro árbitro dos destinos do país, estava farta de guerras, sangrada economicamente pelos enormes sacrifícios que lhe haviam imposto as permanentes guerras do grande Corso; as guerras custam dinheiro, muito dinheiro, e tinham sido, justamente eles, os mercadores e os artesões da França, a fornecê-lo. O povo, de sua parte, embora estivesse desiludido pelas consequências do grande terremoto revolucionário, desencantado, e não mais muito seguro de que uma era de bem-estar se pudesse abrir para a humanidade somente massacrando a classe dirigente,estava todavia, bem cônscio de seus direitos. Ainda que cansado e ensanguentado como se achava (a campanha da Rússia e a guerra da Espanha, principalmente, tinham aberto um largo vácuo nas classes jovens), estaria disposto a lançar, ainda uma vez, a vida de seus filhos e seus bens nas barricadas, desde que não perdesse as grandes conquistas trazidas pela Revolução.
        O rei era um homem bondoso, como o tinha sido seu irmão, mais disposto a conceder do que a negar e, apesar das aparências, não tão cego para pensar que vinte e cinco anos de história pudessem ser cancelados com uma penada. Assim, assistiu ao curioso fenômeno de um rei que se esforçava em acalmar os demasiado acesos fervores dos monárquicos, de um rei em nome do qual se  cometiam homicídios e abusos (foi o chamado "terror  branco", desencadeado contra os ex-revolucionários e bonapartistas) e que tudo teria feito para contê-los ou repará-los. Reação houve, naturalmente, sobretudo nos primeiros anos; depois, o bom senso prevaleceu, embora por breve tempo, sob os ministérios de Richelieu e de Décazes. Os movimentos da Grécia, da Itália, da Espanha, confirmavam os realistas furiosos na necessidade de esmagar pela raiz a ideia liberal, que parecia germinar a cada repressão sanguinolenta. Apóstolos da liberdade, vinte anos antes, os Franceses não se cobriram certamente de glória, ao debelarem a revolução espanhola, em 1823; no local do Trocadero, combateu também Carlos Alberto de Sabóia Carignano, para lá enviado pelo tio, Carlos Félix, para limpar a consciência, bastante embebida de idéias liberalizantes. 
          Os rebeldes espanhóis defendiam-se denodadamente, na fortaleza de Trocadero, contra as tropas da Santa Aliança. E foram justamente as tropas francesas que assumiram o encargo de debelar os fautores daquelas ideias liberais, que na França tinham recebido a crisma de sua validade e universalidade.
            A Revolução de julho (1830) foi o fruto da política insensata dos dois epígonos dos Borbões, Luiz XVII e Carlos X. Humilhada por leis absurdas, a burguesia, nascida dos grandes dias da Revolução Francesa, insurgiu-se e orientou ao assalto o proletariado de Paris, varrendo do trono os anacrônicos representantes de uma época já superada.
           Se Luiz XVII tinha sido um soberano discretamente equânime, tanto que era obrigado, frequentemente, a conter os ministros em seus excessos reacionários, bem diferente foi Carlos X, seu irmão, que lhe sucedeu no trono em 1824. Desde o começo, o novo rei deu provas de suas intensões; a coroação, na catedral de Reims, revocou o fausto medieval que caracterizava aquela de Luiz XVI; da Cãmara foram eliminados todos os deputados não muito ligados; leis anacrônicas tentaram restaurar na França, naquela França que ouvira ecoar os ardentes discursos do Rebesbierre e de Mirabeau, usos já sepultos pelo tempo. Logicamente, a oposição, expulsa do parlamento, reorganizou-se, mais ampla e mais perigosa, entre o povo, nos clubes, nas sociedades secretas. Também na política externa, salvo a esporádica participação na guerra da Grécia, a favor dos rebeldes(participação que fora aconselhada por outros motivos que não de benevolência pelos revoltosos), Carlos X conduziu-se como reacionário; em harmonia com a tendência colonialista do século, deve considerar-se o início da expedição à Argélia, o primeiro passo para a restauração, ou melhor, a criação do império colonial francês.
            Até 1830, todavia, o rei e seus ministros não entraram em choque aberto contra a constituição e o Parlamento, mesmo interpretando muito livremente as normas constitucionais; mas quando, justamente naquele ano, a Câmara tentou impor ao trono a própria autoridade, o soberano lançou fora bruscamente sua máscara, muito transparente,aliás, de monarca constitucional e revelou-se como era na realidade, o mais retrógrado entre os soberanos absolutos. As ordenações reais, dissolvendo a Câmara esquiva, privam a maior parte dos eleitores de seus direitos;  medida inaudita, que não podia deixar de provocar indignação popular. Provavelmente, o rei pensava que a burguesia não se teria lançado ao torvelinho de um revolução e, sobretudo, que não  encontraria nas classes operária e camponesa, pouco atingidas pelas providências, a massa de choque necessária. Entretanto, a revolta ocorreu, imediata, e foi um fenômewno quase exclusivamente parisiense; povo e burguesia tomaram armas, e o rei, ainda uma vez, foi obrigado a fugir da capital (julho de 1830). Foram os liberais - marquês de La Fayette, o duque de Broglie, o banqueiro Laffitte - que se tornaram senhores da situação; foram eles que obrigaram o rei a abdicar, e colocar no trono, em seu lugar, o filho do guilhotinado Filipe "Egalité", Luiz Filipe de Orleans. 
           Luis Filipe de Orleans, herdeiro de um ramo colateral, jura fidelidade à nova constituição. Luis Filipe foi chamado o "rei burguês", devido à simplicidade de seus hábitos. 
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A Arte  Medieval  na França
                   Cinco séculos de quase absoluto silêncio criador sucederam-se à queda do Império Romano do Oriente.; somente na Itália se continuava, embora esporádica e toscamente, a produzir algo de novo, a escrever, a construir. Na França, a primeira nação européia, excluindo-se a Itália, que criou uma arte própria, surgiram, no século XI, as primeiras Igrejas românticas, escuras e maciças, no estilo da basílicas do século IX. Os arquitetos, que havia esquecido as áureas regras de Vitrúvio, (Grande arquiteto romano, que escreveu um "Tratado de Arquitetura) tinham sido obrigados a erigir paredes de enorme espessura, para garantir a estabilidade do edifício, (que frenquentemente ruía devido a erros de cálculo); isto conferia às catedrais românticas aquele aspecto de solidez, que as distingue, ainda hoje, das demais construções. 
            Os erros serviram de guia; gradualmente, também os arquitetos franceses elaboraram seu próprio estilo e elevaram, cada vez mais alto, suas construções, delineando, assim, aquele estilo gótico que fez escola na Europa e que deu maravilhosos exemplos de arquitetura sacra. Essas catedrais, enormes com relação aos edifícios que as circundavam, absorviam, muitas vezes, por vários decênios, as economias e os trabalhos de uma inteira cidade, chamando de toda parte escultores, técnicos em vitrais, entalhadores; assim, a par da arquitetura, prosperou,naquela época, na França, a escultura, enquanto bem escasso relevo teve a pintura, reduzida a bem poucas decorações de altar e preciosas miniaturas de livros, ricas de cores vivas e ingênuos detalhes (basta recordar Dante, que dizia "quel l'arte ch'alluminarè chiamata in Parisi").
             Os castelos franceses da renascença eram, geralmente, construções enormes, em que os adornos do século quatrocentos se sobrepunham à severa arquitetura militar de origem. 
               As construções de imponentes catedrais góticas empenhavam, quase sempre, por muitos decênios, as economias citadinas mobilizando legiões de pedreiros, canteiros, escalpelizadores, vidraceiros e escultores. 
              Nascia, naqueles últimos séculos da Idade Média, o idioma francês, produto da fusão de elementos latinos com o primitivo idioma céltico; floresciam na Provença, delicados poetas, os trovadores, que alegravam as cortes feudais, com suas elegantes canções, baladas e trovas, acompanhadas suavemente pelo alaúde. Bertrand de Born, Arnaud Daniel, Jaufrée Rudel, Bernard de Ventadorn, versejadores de aristocrática pureza, que eram conhecidos também nos países vizinhos. Alguns deles estiveram nas cortes italianas, como Rambaldo de Vaqueiras, e contribuíram para o impulso da lírica peninsular até então presa aos esquemas latinos. Naquela época, floresceram igualmente os longos racontos cavalheirescos, onde se descreviam as proezas dos Pares de Carlos magno ou dos Cavaleiros da Távola Redonda, narrativas originárias da Bretanha e da Provença, e aquele famoso Roman de la Rose, uma espécie de alegoria de mais de vinte mil versos, composto, nos meados do século II, por Guilhaume de Lorris e Jean de Meung e trazido para o italiano por um tal Durante, que alguns chegaram a identificar com Dante Alighieri. 
             Essa notável riqueza artística e literária poderia fazer-nos pensar num período medieval gentil e cortês, como os imaginavam os Românticos do século passado;  na realidade, porém, como já vimos, arte e literatura eram apanágio dos feudatários, ao passo que a burguesia e a plebe jaziam na mais completa ignorância, sobrecarregados de taxas e trabalho, contentando-se, quanto à arte, em admirar os arabescos e os anjos esculpidos nas fachadas dos templos, a assistir, na praça das aldeias ou nas ruas das cidades, aos mistérios (espetáculos sacros, representados por atores nômades) ou ouvir, boquiabertos, um cantastorie, que descrevia as façanhas de Reinaldo ou de Orlando. Mas, já a burguesia começava sua desforra espiritual: as Universidades, surgidas imitando as italianas, criavam, na França, uma aristocracia do pensamento, que logo iria contrapor-se validamente àquela das armas.Alegres e despreocupados, de bolsos vazios, os universitários vagavam pela França cantando suas canções e discutindo teologia e direito. Nascia, com eles, a nova Europa, livre das brumas medievais, pronta para receber o vento fresco da renascença. 
                A arte de miniaturar os grande livros de pergaminho prosperou na França; os livros, escritos a mão, quase sempre sobre pergaminho, eram um gênero de luxo, reservado somente aos nobres e às bibliotecas. Esplendidamente miniaturizados (uma arte tipicamente francesa) eram, via de regra, verdadeiras obras primas, de valor inestimável. 
              O Sorbona, isto é, a faculdade de teologia de Paris, congregava, na Idade Média, a elite da mocidade estudiosa da França. Lembremos que os moços universitários foram os pioneiros da Renascença Francesa. 

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